Imigração italiana no Rio Grande do Sul
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A imigração italiana no Rio Grande do Sul é um processo de transferência de população nativa da Itália para o estado brasileiro do Rio Grande do Sul.
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A imigração iniciou tímida e espontaneamente entre o fim do século XVIII e o início do XIX, e se tornou mais intensa no período de 1875 a 1914, quando através de um programa colonizador do governo brasileiro entraram no estado do Rio Grande do Sul de oitenta a cem mil imigrantes italianos. A maioria vinha fugindo da fome, das epidemias e das guerras na Itália, e viviam como agricultores. O programa visava atender ao que então eram consideradas necessidades: povoar vazios demográficos, branquear a população e estabelecer um sistema produtivo baseado no minifúndio, com a força de trabalho livre e proprietária das terras, que pudesse abastecer o mercado interno com produtos agropecuários.
O projeto enfrentou muitas dificuldades e períodos de tensão e turbulência social, mas acabou sendo em geral bem sucedido. Os imigrantes fundaram diversas cidades e incrementaram significativamente a produção rural, tornando a zona colonial italiana economicamente a segunda mais importante do estado já no início do século XX. Enquanto isso, criavam uma cultura nova, adaptando suas tradições milenares a um novo ambiente. Nas cidades a economia se diversificava amplamente. Surgiam empresas de grande porte, transformando a fisionomia das antigas vilas e também as relações sociais e empregatícias, formando-se uma elite endinheirada que promovia uma cultura erudita, fundava associações e clubes e vivia em palacetes urbanos sofisticados, sustentada por uma massa de proletários marginalizados, muitos deles oriundos do campo.
Apesar das desigualdades que logo se manifestaram na sociedade colonial, desde o início do século XX os sinais do progresso se tornaram evidentes, uma "ética do trabalho" norteava os costumes, e articulou-se um discurso apologético em torno das alegadas qualidades do italiano, apresentando-o como um herói civilizador, um infatigável criador de riquezas, uma rocha de fé e um modelo de virtudes. Esse entusiasmo, em tudo apoiado e incentivado pela oficialidade nativa, foi interrompido durante a Era Vargas, devido ao programa nacionalizante do governo e também ao estado de guerra com a Itália, situações que lançaram um manto de repressão à língua e à cultura italianizada da região. Neste período também mudavam as ênfases produtivas, a indústria e o comércio assumiam a primazia, e os que haviam permanecido no campo sofreram as consequências do declínio do setor agrícola, iniciando um grande êxodo para a cidade, para outras colônias e outros estados.
Na década de 1950, depois da repressão, iniciou um processo de reconciliação dos italianos e seus descendentes com os brasileiros, e o sinal mais visível disso foi a inauguração do Monumento Nacional ao Imigrante em 1954 em Caxias do Sul. Desde então foi retomado aquele discurso grandiloquente sobre o imigrante italiano, misto de herói, santo e profeta, enquanto a região realizava uma ampla transição não apenas para um novo modelo econômico, mas também iniciava uma revolução nos costumes. Abria-se uma fase de rápida perda de tradições e de degradação ou destruição sistemática de evidências do passado, tais como documentos, monumentos, arquitetura vernácula e obras de arte sacra. Se até a década de 1940 os italianos raramente se consideravam brasileiros e tudo o que se referisse às raízes rurais e à antiga Pátria distante era motivo de orgulho, agora era necessário que se criasse uma nova identidade, que se integrasse plenamente na brasilidade, e essa brasilidade "oficial" prescrita para a região colonial era essencialmente lusófona, urbana, burguesa e adepta da inovação, desde que a moralidade permanecesse inabalada. O futuro estava na modernidade, o rádio e a TV difundiam o cosmopolitismo e a cultura de massa, e erodia com celeridade a memória ancestral num esforço deliberado de auto-esquecimento, assim como erodia o ethos comunitário típico da primeira sociedade colonial, ainda ligada ao campo. O "ser colono", que antes mitificara o imigrante, se tornou, para as novas gerações, motivo de embaraço, enquanto o discurso oficial exaltava a transformação do agricultor pobre num industrial de sucesso, mitificando-o de outra maneira.
O reflexo prático do programa modernizador foi o intenso crescimento do setor industrial, com o desenvolvimento de um forte polo metal-mecânico, concentrado em Caxias do Sul, cidade que devido a uma localização privilegiada se colocou desde o século XIX na dianteira da maioria dos avanços, tornando-se a reluzente vitrine que provava a sabedoria dos projetos do governo. Hoje a antiga região colonial italiana é densamente povoada e uma das mais ricas, dinâmicas e populosas do estado. Esse crescimento acentuado e acelerado não ocorreu sem reproduzir a longa lista de males da civilização contemporânea, como a violência urbana, a desigualdade e exclusão dos pobres, a devastação ambiental, as políticas ineficientes, a especulação econômica e imobiliária, a escassez de moradia popular, de saneamento, de cultura, a precariedade de serviços básicos, problemas que têm se tornado importantes nas últimas décadas, variando de intensidade conforme o local.
Entre acertos e erros, os italianos deixaram uma marca das mais relevantes no estado que os acolheu, e não se limitando às antigas colônias, se espalharam por todo o território. Influíram decisivamente na economia, na política, na sociedade, na arte e na cultura, fundaram jornais, teatros, cinemas, museus, clubes esportivos e recreativos, associações empresariais e beneficentes, educandários, muitos em funcionamento até hoje. Desde as primeiras Festas da Uva a cultura italiana se tornou matéria de discurso político e fonte de renda como turismo e entretenimento. Sua história, seus costumes e tradições foram incorporados ao imaginário coletivo e são objeto de estudo acadêmico intenso. Seus pratos mais típicos, como a polenta e o galeto assado, são apreciados por todos os rio-grandenses; palavras e expressões se fixaram no vocabulário; sua religiosidade deixou um legado ainda visível nas centenas de igrejas e capelas que escaparam da onda de modernização, assim como são um legado único suas antigas cantinas, moinhos e casarões, que embora reconhecidos como patrimônio, e a despeito da propaganda oficial, ainda estão ameaçados e sofrem perdas repetidas. Essa história está em todos os livros escolares, mas ainda persistem muitos mitos e estereótipos entre a população, que ainda tendem a colocar o imigrante italiano nas alturas, dissimulando suas contradições e a contribuição de outras etnias na evolução das antigas colônias. De toda forma, a grande abundância de estudos críticos que o tema da imigração italiana no sul já produziu é uma prova da vitalidade e relevância da contribuição dos viajantes na história e para a formação do Rio Grande do Sul moderno. Grande parte dos sobrenomes presentes no estado são italianos. A imigração tem sido um processo histórico continuado. Ainda hoje chegam italianos ao estado, embora em pequenos números.