Turquia
país abrangendo a Ásia Ocidental e o sudeste da Europa / De Wikipedia, a enciclopédia encyclopedia
A Turquia (em turco: Türkiye, pronunciado: [ˈtyrcije]), cujo nome oficial é República da Turquia (Türkiye Cumhuriyeti, pronunciado: [ˈtyrcije d͡ʒumˈhurijeti] (escutarⓘ)), é um país transcontinental, com a maior parte de seu território localizada na Ásia Ocidental e uma parte menor (a oeste do Mar de Mármara) na Europa Oriental, estendendo-se pela península da Anatólia e pela Trácia Oriental na região dos Bálcãs. É um dos seis estados independentes cuja população é maioritariamente turca. Faz fronteira com oito países: a noroeste com a Bulgária, a oeste com a Grécia, a nordeste com a Geórgia, a Arménia e o enclave de Naquichevão do Azerbaijão, a leste com o Irão e a sudeste com o Iraque e a Síria. O mar Mediterrâneo e o Chipre situam-se a sul, o mar Egeu a sudoeste-oeste e o mar Negro a norte. O mar de Mármara, o Bósforo e o Dardanelos (que juntos formam os Estreitos Turcos) demarcam a fronteira entre a Trácia e a Anatólia e separam a Europa da Ásia.[lower-alpha 1][7]
República da Turquia Türkiye Cumhuriyeti | |||||
| |||||
Lema: Yurtta sulh, cihanda sulh (turco: "Paz em casa, Paz no mundo") | |||||
Hino nacional: İstiklâl Marşı | |||||
Gentílico: Turco(a) | |||||
Localização da Turquia no globo mundial | |||||
Capital | Ancara 39°55'N 32°50'E | ||||
Cidade mais populosa | Istambul | ||||
Língua oficial | turco | ||||
Governo | República unitária presidencialista[1] | ||||
• Fundador | Mustafa Kemal Atatürk | ||||
• Presidente | Recep Tayyip Erdoğan | ||||
• Vice-presidente | Cevdet Yılmaz | ||||
• Presidente do Parlamento | Numan Kurtulmuş | ||||
• Presidente do Tribunal Constitucional | Zühtü Arslan | ||||
Sucessão | do Império Otomano | ||||
• Guerra da Independência | 19 de maio de 1919 | ||||
• Formação do Parlamento | 23 de abril de 1920 | ||||
• Declaração da República | 29 de outubro de 1923 | ||||
Área | |||||
• Total | 783 562 km² (37.º) | ||||
• Água (%) | 2,03 | ||||
Fronteira | Grécia, Bulgária, Geórgia, Arménia, Azerbaijão, Irão, Iraque e Síria | ||||
População | |||||
• Estimativa para 2023 | 85 816 190[2] hab. | ||||
• Censo 2022 | 84 680 273[3] hab. | ||||
• Densidade | 108,1 hab./km² (104.º) | ||||
PIB (base PPC) | Estimativa de 2023 | ||||
• Total | US$ 3,613 trilhões * [4] | ||||
• Per capita | US$ 41 887[4] | ||||
PIB (nominal) | Estimativa de 2023 | ||||
• Total | US$ 1,154 trilhão * [4] | ||||
• Per capita | US$ 13 383 | ||||
IDH (2021) | 0,838 (48.º) – muito alto[5] | ||||
Gini (2019) | 41,9[6] | ||||
Moeda | Lira turca (TRY ) | ||||
Fuso horário | UTC+3 | ||||
Cód. ISO | TR | ||||
Cód. Internet | .tr | ||||
Cód. telef. | +90 | ||||
Website governamental | tccb |
Os turcos começaram a migrar para a área que é atualmente a Turquia ("terra dos turcos") no século XI. O processo foi acelerado pela vitória do Império Seljúcida sobre o Império Bizantino, na Batalha de Manziquerta. Os turcos seljúcidas constituíram um poderoso reino na Anatólia nos 150 anos seguintes, o Sultanato de Rum, que governou grande parte da Anatólia até às invasões mongóis, em meados do século XIII. A decadência do sultanato seljúcida deu origem à independência e expansão política e militar de uma série de beilhiques (principados muçulmanos), entre eles o dos otomanos, que viriam a absorver os restantes beilhiques e a criar o Império Otomano, que no seu auge, nos séculos XVI e XVII, se estendia desde o Sudeste da Europa ao Sudoeste da Ásia e Norte da África. Após o Império Otomano ter entrado em colapso, na sequência da derrota na Primeira Guerra Mundial, os seus territórios foram ocupados pelos aliados vitoriosos. Um grupo de jovens oficiais militares, liderados por Mustafa Kemal, organizou uma resistência contra os Aliados, e em 1923 estabeleceu a moderna República da Turquia, com Kemal Atatürk como seu primeiro presidente.
A localização da Turquia, entre a Europa e a Ásia, torna o país geoestrategicamente importante.[8][9] A religião predominante no país é o Islão, com pequenas minorias de cristãos e judeus. A língua oficial do país é o turco, falado pela esmagadora maioria da população. A segunda língua mais usada é o curdo, falado pela maior minoria do país, os curdos, que representam cerca de 18% da população. As restantes minorias constituem entre 7 e 12% da população.[10]
A Turquia é uma república unitária presidencialista, com uma antiga herança cultural. O país tem relações estreitas com o Ocidente, nomeadamente através da sua presença em organizações como o Conselho da Europa, OTAN, OCDE, OSCE e G20. A Turquia iniciou as negociações de adesão plena à União Europeia em 2005, da qual é membro associado desde 1963 e com a qual tem um acordo de união aduaneira desde 1995. O país também tem fomentado estreitas relações culturais, políticas, económicas e industriais com o Médio Oriente, com os estados turcos da Ásia Central, com os países africanos através da participação em organizações como a Organização para a Cooperação Islâmica e a Organização de Cooperação Económica e com os países de língua portuguesa através da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, na qual tem o estatuto de observador associado.[11] Devido à sua localização estratégica, à sua grande economia e às suas forças armadas, a Turquia é classificada como uma potência regional.[12]
O nome da Turquia nas línguas europeias latinas provém do latim medieval Turchia, cuja primeira referência conhecida é de cerca de 1369, e é muito semelhante ao termo Τουρκία do grego medieval.[13][lower-alpha 1] O nome da Turquia em turco (Türkiye) é composto de duas partes: türk e o sufixo iye. Türk significa "ser humano" ou "forte" nas antigas línguas turcomanas, e geralmente aplica-se aos habitantes da Turquia ou aos membros de povos turcos ou turcomanos.[14] O sufixo iye significa "proprietário" ou "relacionado com" e é derivado do árabe iyya, mas também pode estar associado ao sufixo ia de Turchia do latim medieval e ao sufixo ία (de Τουρκία) do grego medieval.[13]
As primeiras referências escritas ao termo türk ou türük, datadas do século VIII, encontram-se nas inscrições de Orkhon, encontradas no vale do mesmo nome, na Mongólia, produzidas pelos Goturcos (turcos celestes ou azuis).[lower-alpha 2] O termo está ainda relacionado com tu–kin ou tu-jue, nome dado pelos chineses aos povos que viviam a sul das Montanhas Altai, que aparece em documentos de 177 a.C.[13][15][lower-alpha 3]
Antiguidade e impérios romano e bizantino
A Península da Anatólia, que constitui a maior parte do que é hoje a Turquia, é uma das regiões continuamente habitadas desde há mais tempo. Os assentamentos neolíticos mais antigos, como Pınarbaşı, Aşıklı Höyük, Kaletepe Deresi, Çatalhüyük, Çayönü, Nevalı Çori, Hacılar, Göbekli Tepe e Yumuktepe (esta última dentro da atual cidade de Mersin), encontram-se entre os mais antigos do mundo.[lower-alpha 1][16][17]
O assentamento de Troia foi fundado no Neolítico e foi habitado até à Idade do Ferro. Ao longo da história, os anatólios falaram línguas indo-europeias, semíticas e caucasianas meridionais, além de outras de filiação incerta.[17] A antiguidade da língua hitita indo-europeia e das línguas luvitas levou alguns estudiosos a pôr a hipótese da Anatólia ter sido o centro a partir do qual as línguas indo-europeias se difundiram.[18]
Os hatitas (ou Hati) foram um povo que habitou o centro da Anatólia cerca de 2 300 a.C., senão antes. Os hititas estabeleceram-se na Anatólia e gradualmente absorveram os hatitas, cerca de 2 000−1 700 a.C.,[19][20] fundando primeiro grande império da área, que existiu entre os séculos XVIII e XIII a.C., rivalizando em poder com o Antigo Egito.[21]
O assentamento calcolítico de Canés (em acádio: Kaneš, a Nesa dos hititas), situada junto à atual aldeia de Cultepe, perto de Caiseri, foi habitado desde o 4,º milénio a.C. e tornou-se o primeiro entreposto comercial da história. No século XX a.C. existiam no local duas localidades — a cidade hitita de Canés e a de Carum, uma colónia assíria, onde florescia o comércio entre hititas e assírios.[21] Estes colonizaram partes do que é hoje o sudeste o centro-leste da Turquia entre 1 950 a.C. e 612 a.C., ano em que os caldeus conquistaram o Império Assírio da Babilônia.[22][23]
Após o colapso do império hitita, os frígios, outro povo indo-europeu, estabeleceu o Reino da Frígia, o mais poderoso estado da região até que foi destruído pelos cimérios no século VII a.C.[24] Os estados mais poderosos dentre os sucessores da Frígia foram os reinos da Lídia, da Cária e da Lícia.[25]
A partir de 1 200 a.C., as costas da Anatólia foram intensamente colonizadas por gregos eólios e jónicos, que fundaram inúmeras cidades importantes, como Mileto, Éfeso, Esmirna e Bizâncio. O primeiro estado estabelecido na Anatólia que foi chamado Arménia pelos povos vizinhos, mencionado por Hecateu de Mileto e na inscrição de Beistum, foi o da dinastia orôntida, fundado no século VI a.C., durou até 72 d.C.[lower-alpha 1][26]
A Anatólia foi conquistada pelo Império Aqueménida nos séculos VI e VII a.C. e posteriormente por Alexandre, o Grande em 334 a.C.[27] Após a morte de Alexandre, a Anatólia foi dividida em pequenos reinos helênicos, nomeadamente a Bitínia, a Capadócia, Pérgamo e o Ponto. Todos estes reinos tinham sido absorvidos pela República Romana em meados do século I d.C.[28] A Arménia arsácida, o primeiro estado da história a adotar o Cristianismo como religião oficial, ocupava parte da Anatólia Oriental.[26][29]
Em 324 o imperador romano Constantino I escolheu Bizâncio para capital do Império Romano, rebatizando-a de Nova Roma (após a sua morte mudaria de nome para Constantinopla e atualmente chama-se Istambul). Constantinopla foi também a capital do Império Romano do Oriente, que existiu intermitentemente entre 286 e o século V, e que passaria a ser conhecido como Império Bizantino, sobretudo depois da Queda do Império Romano do Ocidente, no final do século V.[30]
Reinos turcos e Império Otomano
Os seljúcidas eram um ramo dos turcos oguzes (Kınık Oğuz ou Oğuzlar) que no século X viviam na periferia dos domínios muçulmanos dos Abássidas, a norte dos mares Cáspio e de Aral, num dos jabgus grão-cãs da confederação oguz.[31] No século XI os seljúcidas começaram a emigrar para as regiões orientais da Anatólia, que se tornariam a pátria dos oguzes após a Batalha de Manziquerta, em 1071, na qual os turcos derrotaram os bizantinos. Esta vitória foi determinante para a formação do Sultanato seljúcida da Anatólia (ou Sultanato de Rum), que começou como um ramo separado do Império Seljúcida que dominava partes da Ásia Central, Irão, Anatólia e Sudoeste Asiático.[lower-alpha 1][32]
Em 1243 os exércitos seljúcidas foram derrotados pelos mongóis, o que causou a progressiva desintegração do poder seljúcida, que na prática passou para as mãos de uma série de principados (beilhiques ou beyliks) que, tendo começado por ser tributários do Sultanato de Rum, ganharam independência a partir do século XIII. Um destes beilhiques, o dos otomanos (osmanlı, "descendentes de Osmã), acabou por se impor aos restantes, principalmente a partir do reinado de Osmã I, que declarou a independência em 1299 e é oficialmente considerado o fundador da dinastia otomana. O beilhique otomano expandiu-se ao longo dos dois séculos seguintes, absorvendo os restantes estados turcos da Anatólia, e conquistando territórios na Trácia, Balcãs e no Levante, tornando-se o Império Otomano. Em 29 de maio de 1453 os otomanos liderados pelo sultão Maomé II, o Conquistador (Fatih), acabaram com o Império Bizantino ao conquistarem a sua capital, Constantinopla, um acontecimento que muitos consideram marcar o fim da Idade Média.[33]
O Império Otomano atingiu o seu apogeu nos séculos XVI e XVII, quando foi uma das maiores potências mundiais, particularmente durante o reinado de Solimão, o Magnífico, que durou de 1520 a 1566. No final do século XVI, os territórios sob administração otomana estendiam-se sobre uma área de 5,6 milhões de km², que ia desde os Balcãs e partes da Hungria, a oeste, até ao que são hoje os países árabes, além de quase toda a costa mediterrânica do Norte de África e de todas as áreas costeiras do mar Negro.[9]
Os otomanos ameaçaram seriamente a Europa Central e Itália, tendo chegado a conquistar temporariamente alguns territórios, a cercar Viena em duas e a combater no sul da atual Polónia.[9] No mar, os otomanos combateram pelo controle do Mediterrâneo com a Liga Santa, constituída por diversos estados cristãos, nomeadamente a República de Veneza, a Espanha e Áustria dos Habsburgos, os Cavaleiros de São João (Ordem de Malta) e a generalidade dos estados italianos. A expansão marítima otomana no Mediterrâneo só foi detida pela derrota na Batalha de Lepanto (7 de outubro de 1571). No Oceano Índico os otomanos combateram contra as armadas portuguesas para defenderem o monopólio ancestral do comércio marítimo entre a Índia e Ásia Oriental com a Europa, seriamente ameaçado pela Descoberta do caminho marítimo para a Índia por Vasco da Gama em 1498. Além dos confrontos militares com cristãos, os otomanos defrontaram-se ocasionalmente com os persas (por vezes aliados dos portugueses) nos séculos XVI, XVII e XVIII, quer por disputas territoriais, quer por diferendos religiosos.[34] Os séculos XVIII e XIX foram de declínio para o Império Otomano. Durante este período o império foi gradualmente diminuindo em tamanho, poderio militar e riqueza. No virar do século XIX para o século XX a Alemanha de Guilherme II tornou-se um dos principais aliados do império, o que levou os otomanos a entrar na Primeira Grande Guerra ao lado dos Impérios Centrais. A guerra representou uma pesada derrota para o Império Otomano, apesar das vitórias obtidas por Mustafa Kemal (que viria a ficar conhecido por Atatürk), nomeadamente a da Galípoli, uma derrota inesperada para as forças britânicas e francesas, onde morreram quase meio milhão de homens de ambos os lados e que fez de Mustafa Kemal um herói nacional.[25]
A partir de 12 de novembro de 1918, logo a seguir ao Armistício de Mudros, que marcou o fim das hostilidades da Primeira Grande Guerra no Médio Oriente, as potências europeias vitoriosas ocuparam Constantinopla. Esmirna foi ocupada por tropas gregas a 21 de maio de 1919.[33] Em 1917, antes do fim da guerra, a França, Itália e Reino Unido tinham assinado o Acordo de Saint-Jean-de-Maurienne, que previa a partilha do Império Otomano após o fim da guerra. A 10 de outubro de 1920 o débil governo imperial foi forçado a assinar o Tratado de Sèvres, o qual previa a entrega à França e ao Reino Unido da Palestina, Síria, Líbano e Mesopotâmia, a desmilitarização e transformação em zonas internacionais dos estreitos do Bósforo, dos Dardanelos e do mar de Mármara. O tratado determinava ainda a entrega à Grécia da região de Esmirna e de todos os territórios europeus à exceção de Constantinopla, de grande parte do leste e sudeste da Anatólia à França e da região de Antália e as ilhas do Dodecaneso (estas já efetivamente ocupadas desde 1911) a Itália.[35]
Guerra de independência
A ocupação de Istambul pelos Aliados e de Esmirna pelos gregos, com o apoio tácito dos restantes Aliados, despoletou a criação do Movimento Nacional Turco, criado em 19 de maio de 1919 sob a liderança de Mustafa Kemal. O movimento opunha-se à divisão e ocupação do país e a sua fundação é geralmente apontada como o primeiro evento da Guerra de independência turca. Aos confrontos políticos somaram-se os militares, um pouco por toda a parte e envolvendo todos os lados, embora em diferentes graus.[8][36]
A nordeste travou-se a Guerra Turco-Arménia, que terminou em dezembro de 1920 com os tratados de Alexandropol e de Kars.[37] A Guerra Franco-Turca teve como palco o sudeste e sul — aí as hostilidades terminaram em março de 1921, com a assinatura do Tratado de Paz da Cilícia e posteriormente com o Tratado de Ancara, assinado em outubro.[38]
Os combates mais sangrentos deram-se entre os nacionalistas turcos e as forças gregas (Guerra Greco-Turca), as quais chegaram a ter o controlo de grande parte da Anatólia a oeste e sudoeste de Ancara, quartel-general dos nacionalistas, a qual chegou a estar na eminência de ser conquistada.[36][39] No verão de 1922 os nacionalistas turcos empreenderam uma ofensiva contra as forças gregas que culminou na tomada de Esmirna, que marcou a derrota definitiva dos gregos e ficou tristemente célebre pelas pilhagens, massacres e pelo grande incêndio que devastou a cidade.[9][40]
A paz definitiva foi alcançada com o Armistício de Mudanya, assinado por todas as partes a 11 de outubro de 1922. A 24 de julho de 1923 foi assinado o Tratado de Lausana, onde se reconhecia formalmente o governo dos nacionalistas sediado em Ancara como sucessor do poder otomano e se definiam as fronteiras da Turquia.[39]
O fim da guerra ficou marcado pela primeira transferência populacional compulsiva em larga escala do século XX, que envolveu a troca entre os cidadãos cristãos da Turquia (na sua maioria gregos ortodoxos) e os muçulmanos da Grécia.[41][42][43] Calcula-se que cerca de dois milhões de pessoas foram deslocadas das suas terras ancestrais.[44] Os cristãos de Istambul foram poupados à expulsão, mas muitos deles optaram por emigrar. No entanto, as leis discriminatórias das décadas de 1930[45] e 1942 e os incidentes violentos de 1955 contra a comunidade grega de Istambul provocou a diminuição drástica do número de gregos nessa cidade, que passou de 200 000 em 1924 para pouco mais de 2 500 em 2006.[46]
República
O Império Otomano terminou oficialmente em 1 de novembro de 1922, quando a Grande Assembleia Nacional aboliu o cargo de sultão, destituindo Mehmed VI. O primo deste, Abdulmecide II, foi nomeado (apenas simbolicamente) califa. A República da Turquia foi oficialmente proclamada a 29 de outubro de 1923.[9] A 3 de março de 1924 foi decretada a expulsão da família real otomana e abolição do califado, o que constituiu um claro sinal da laicidade e irreversibilidade do regime.[36]
Mustafa Kemal tornou-se o primeiro presidente da república e empreendeu um vasto programa de reformas que tinha como objetivo tornar a Turquia um estado secular moderno, baseado na ideologia que é conhecida como kemalismo.[9] As mulheres passaram a ter os mesmos direitos legais que os homens, inclusivamente de voto, algo que não existia então em muitos países europeus. Foi publicado um código civil baseado no suíço e um código penal baseado no italiano.[47] A educação passou para as mãos do estado, sendo encerradas as escolas islâmicas.[48] Em 1928 foi adotado o alfabeto turco, de grafia latina,[49] em substituição dos alfabetos árabe e persa.[48][50]
A Turquia permaneceu neutra durante a maior parte da Segunda Guerra Mundial, mas acabou por se juntar aos Aliados a 23 de fevereiro de 1945. Após o final do conflito tornou-se membro das Nações Unidas.[51] A Guerra Civil da Grécia (1946–1949), que opôs o governo monárquico apoiado pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido, aos rebeldes comunistas, e as exigências da União Soviética em estabelecer bases militares nos Estreitos Turcos, levou os Estados Unidos à criação da Doutrina Truman, a qual defendia o apoio militar e económico em larga escala à Grécia e Turquia para conter a expansão comunista nos respetivos países.[52]
Depois de participar nas forças das Nações Unidas que combateram na Guerra da Coreia, a Turquia aderiu à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN ou NATO) em 1952, tornando-se um bastião contra a expansão soviética no Mediterrâneo. Após uma década de violência étnica em Chipre e do golpe militar dos cipriotas gregos que depôs o arcebispo Makarios da presidência, a Turquia invadiu a ilha em 1974; nove anos depois foi proclamada a República Turca de Chipre do Norte, a qual só é reconhecida pela Turquia.[53][54]
Até 1945, a República da Turquia foi um regime unipartidário. A transição para uma democracia pluripartidária foi tumultuosa. Em 1960, 1971, 1980 e 1997 ocorreram golpes de estado militares que interromperam a democracia e originaram governos muito repressivos.[55][56] O golpe militar de 1997 é chamado por muitos de golpe pós-moderno porque os militares não tomaram o poder de facto, limitando-se a impor as suas condições que passavam principalmente pela defesa da manutenção estrita do secularismo kemalista, por oposição às tendências islâmicas de alguns dos partidos mais votados.[57][58][59]
A liberalização da economia iniciada na década de 1980 mudou completamente o panorama económico, com sucessivos períodos de crescimento acentuado e a crise do final da década seguinte.[60] A cooperação económica da Turquia com a Comunidade Económica Europeia (CEE), a antecessora da União Europeia (UE), data de 1959, ano em que solicitou pela primeira vez a sua adesão. Desde 1963 que o país é um membro associado da CEE. Em 1987 foi apresentada formalmente a candidatura à adesão, mas as negociações formais só se iniciaram em 2005.[61]
O referendo de 12 de setembro de 2010 abriu caminho a alterações constitucionais que vão no sentido de aproximar a democracia turca aos modelos ocidentais. O sim no referendo teve o apoio de setores islâmicos menos moderados porque se espera que a liberalização acabe de vez com as proibições radicalmente laicas impostas por Atatürk, das quais a mais emblemática é a proibição do uso do véu em instituições públicas, nomeadamente escolas, o que, segundo alguns, leva a que as jovens de famílias mais conservadoras tenham dificuldades no acesso à educação devido às crenças religiosas que as obrigam a usar véu em público.[62][63][64][65]
Em 15 de julho de 2016, fações das forças armadas levaram a cabo uma tentativa de golpe de Estado para derrubar o governo e o presidente Recep Erdoğan. As forças militares tomaram partes de Ancara e Istambul e duas pontes sobre o Bósforo foram fechadas.[66] No entanto, o golpe fracassou e milhares de militares foram presos, entre eles o general Bekir Ercan Van, comandante da base aérea de İncirlik, usada pelos Estados Unidos para lançar ataques aéreos contra o Estado Islâmico do Iraque e do Levante.[67] Nos dias que se seguiram foram demitidos milhares de funcionários públicos, nomeadamente do sistema judicial, polícia e educação.[68][69]
A Turquia é um país transcontinental situado na Eurásia cujo território é aproximadamente um retângulo, localizado entre as coordenadas 36° a 42° norte e 26° a 45° leste, com cerca de 1 500 km na direção leste-oeste, 1 650 km na direção sudeste-noroeste e entre 450 e 650 km na direção norte-sul. A oeste do mar de Mármara e dos Estreitos Turcos situa-se a parte europeia, a Trácia Oriental, que constitui 3% (23 764 km²) da área do país. A leste situa-se a parte asiática, a península da Anatólia, a qual constitui 97% (755 688 km²) da Turquia. A área total, incluindo lagos, é de 779 452 km², o que faz do país o 36.º do mundo em superfície.[70]
As variadas paisagens da Turquia são o produto de complexos movimentos telúricos que deram forma à região ao longo de milhões de anos e ainda se manifestam em sismos relativamente frequentes. As últimas erupções vulcânicas ocorreram em tempos históricos, nomeadamente no monte Argeu, próximo da atual Kayseri.[71][72] O Bósforo, os Dardanelos e o mar Negro devem a sua existência às falhas geológicas que atravessam o território turco. Os sismos na Turquia são provocados principalmente pela Falha Setentrional da Anatólia e à Falha Oriental da Anatólia.[73]
A maior cidade do país e da Europa, Istambul (anteriormente chamada Bizâncio, depois Constantinopla), encontra-se entre a Trácia e a Anatólia, dividida ao meio pelo Estreito do Bósforo. É a única cidade do mundo situada em dois continentes.[74]
A Anatólia (também conhecida como Ásia Menor) está rodeada por mar em três dos seus lados — a sul pelo mar Mediterrâneo, a oeste pelo mar Egeu, a noroeste pelo mar de Mármara e pelos Estreitos Turcos, e a norte pelo mar Negro. Este está ligado ao mar de Mármara pelo Estreito do Bósforo, que divide a antiga capital Istambul em duas. Por sua vez, o mar de Mármara está ligado ao mar Egeu pelo Estreito de Dardanelos.[75]
A Trácia Oriental é constituída por colinas de pouca altitude e declive suave na sua maior parte, acentuando-se ligeiramente o relevo junto às costas do mar de Mármara e do Bósforo. A Anatólia é formada por um planalto central, rodeado na sua maior parte de montanhas que o isolam do mar Negro, do Mediterrâneo e do resto da Ásia, existindo também zonas montanhosas no interior. Entre as montanhas e as costas, existem geralmente planícies costeiras, geralmente estreitas, e vales, por vezes bastante largos, embora em muitos lugares as montanhas cheguem ao mar.[76][77]
Topografia
As montanhas tendem a ser mais altas a leste — tipicamente, os cumes mais altos a oeste não ultrapassam os 1 500 m, embora haja picos acima dos 2 000 m, como por exemplo o Uludağ, perto de Bursa e do mar de Mármara, cujo ponto mais alto se situa a 2 543 m.[76] Nas montanhas que rodeiam a Anatólia Central são comuns os cumes com mais de 2 000 m e existem diversos bastante mais altos.[77]
De forma semelhante, o terreno do chamado planalto da Anatólia, um termo que alguns aplicam a uma faixa a oeste do Lago Tuz e outros a praticamente toda a Anatólia Central, é progressivamente mais acidentado, variando a altitude média entre os 600 e os 1 200 m. Nas regiões mais a leste, onde o planalto é substituído por terrenos mais montanhosos, as altitudes médias mais comuns situam-se entre os 1 500 e os 2 000 m.[77][78]
As cordilheiras mais extensas e mais altas são os montes Tauro (Toros Dağları), a sul e leste, e os montes Pônticos (Kuzey Anadolu Dağları), a nordeste. Entre as costas norte e noroeste da Anatólia e o interior erguem-se os montes Köroğlu.[77]
A montanha mais alta da Turquia é o monte Ararate (Ağrı Dağı), um vulcão extinto com 5 165 m, onde, segundo a tradição judaico-cristã, atracou a Arca de Noé, a qual, segundo a lenda, está enterrada no cume. O monte Ararate e o seu vizinho "Pequeno Ararate" (também chamado monte Sis ou Küçük Ağrı em turco) situam-se no Planalto Arménio, junto ao local onde se encontram as fronteiras da Turquia, Arménia e Irão. São geralmente classificados como montanhas isoladas, mas também se usa o termo "maciço de Ağrı" para designar a formação montanhosa onde se inserem. Outros autores consideram o maciço como parte do Cáucaso e outros como fazendo parte do Tauro Oriental.[79][80][81]
Clima
Embora a maior parte do território da Turquia tenha um clima que se pode considerar mediterrânico, a variedade da topografia e principalmente a existência de cadeias de montanhas que correm paralelamente a quase todas as regiões costeiras, que impedem que a influência marítima avance para o interior, criam grandes variações climáticas regionais.[82][83][84]
O clima das áreas litorais do Egeu e do Mediterrâneo é do tipo mediterrânico, com invernos chuvosos e verões quentes e relativamente secos, embora com elevada humidade relativa. As temperaturas no inverno podem ser bastante baixas, principalmente a ocidente, mas geralmente são relativamente amenas, sobretudo a leste de Antália.[77][82][83][84]
Na região de Mármara e do Bósforo, uma zona de transição entre o clima mediterrânico, a sul, e o clima oceânico do mar Negro, a norte, as condições climatéricas têm muitas semelhanças com as do sul e norte.[82][83][84][85]
No entanto, os invernos tendem a ser mais frios, sendo frequentes temperaturas negativas e neve no inverno, alguns dias frios na primavera, verão e outono, e chuvas estivais. À semelhança do que se passa na generalidade da Anatólia ocidental, as temperaturas médias rondam os 5 °C no inverno, com mínimas muito próximas de 0 °C, e 23 °C no verão, sendo frequentes máximas próximas dos 35 °C.[82][83][84][85]
As regiões costeiras do mar Negro, que têm um clima oceânico, são úmidas e apresentam verões menos quentes e mais chuvosos que as restantes áreas costeiras.[82][83][84][86] O interior da Anatólia, com um clima continental semiárido, apresenta grandes amplitudes térmicas, tanto diárias como anuais, com verões muito quentes e invernos muito rigorosos. Nas regiões de leste e sudeste os invernos são longos e mais frios do que no resto do território — algumas zonas ficam cobertas de neve entre novembro e abril. As áreas mais secas situam-se na Região do Sudeste da Anatólia e na província de Cónia, onde a precipitação média anual não ultrapassa os 300 mm.[77][82][83][84]
Fauna e flora
A fauna e a flora turcas estão sob proteção do Estado em parques nacionais e reservas, locais estes estabelecidos para preservar plantas e animais da devastação agrícola e industrial. A vegetação típica da Turquia reflete a variedade exibida no seu território. Como exemplo, vê-se na costa do Mediterrâneo a predominância do verde, com a presença da podocytisus e de plantações comuns na área, como a de oliveiras e parreiras. Já na região central, predominam as estepes donas de uma variedade diferente de flores, como os grandes narcisos amarelos, enquanto na parte montanhosa prevalecem raras tulipas e jacintos azuis. Existem ainda densas florestas coníferas na cadeia do Tauro, lar de peónias e orquídeas; e vales verdes de vegetação silvestre e pinheiros ao longo da costa do mar Negro.[87]
Em geral, compõem a fauna turca, ursos, lobos, águias, o leopardo-da-anatólia e outras variedades. Na região do Bósforo, podem observar-se diversas aves de rapina num total de 440 espécies diferentes, sendo a Reserva Natural Kuşcennetti o melhor local para observá-las. Nos ribeiros das montanhas encontram-se espécies de peixes e na região do lago de Vã.[87] O turco Van, uma raça de gatos pelagem branca, é originária dessa região.[88]