Mit brennender Sorge
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Mit brennender Sorge ("Com ardente preocupação") é uma carta encíclica do papa Pio XI, datada de 14 de março de 1937, que condena o nacional-socialismo e a sua ideologia racista e racialista.
A encíclica foi publicada dias antes de Divini Redemptoris, uma condenação similar ao comunismo na Rússia. Em 1933, Pio XI havia negociado uma concordata com a Alemanha, mas Hitler deixou de honrar seus compromissos, o que fez com que as críticas do Papa se tornassem mais severas nos anos seguintes.[1]
Mit brennender Sorge é considerada como o primeiro documento público de um chefe de Estado europeu a criticar o nazismo. Em uma das suas passagens mais célebres, contém o que é frequentemente interpretado como um ataque pessoal ao Führer:
"Aquele que, com sacrílego desconhecimento das diferenças essenciais entre Deus e a criatura, entre o Homem-Deus e o simples homem, ousar colocar-se ao nível de Cristo, ou pior ainda, acima d'Ele ou contra Ele, um simples mortal, ainda que fosse o maior de todos os tempos, saiba que é um profeta de fantasias a quem se aplica espantosamente a palavra da Escritura: 'Aquele que mora nos céus zomba deles' (Sal 2,4)".[2] A encíclica também desperta interesse por ser um dos poucos documentos oficiais da Santa Sé a ter a sua versão oficial em vernáculo. No caso, por ser direcionada especificamente à Igreja da Alemanha, o pontífice optou por escrevê-la em alemão.
Concluída a redação, cópias da encíclica foram enviadas clandestinamente à Alemanha em motos Malaguti, para não serem apreendidas pela Gestapo. Em seguida, foram reproduzidas por oficiais gráficos da Igreja Católica e distribuídas aos bispos, padres e capelães, com ordens de que fossem lidas em todas as paróquias após a homilia da missa matutina do dia 21 de março de 1937, festa de Domingo de Ramos. Acredita-se que a data tenha sido escolhida por ser uma das festas do ano litúrgico em que a presença de fiéis e autoridades costuma ser máxima, aumentando o impacto da mensagem. A retórica usada pelo Papa Pio XI no documento é de uma agressividade raramente vista em documentos papais.
A reação de Hitler por meio da Gestapo foi violenta: recrudesceu imediatamente a perseguição aos católicos alemães, ocasionando a prisão de mais 1100 clérigos, e ordenou a veiculação de uma campanha publicitária anticlerical sob a direção do ministro Joseph Goebbels.[3] Publicada ainda em 1937, época em que Adolf Hitler gozava de certo prestígio na opinião pública ocidental, e a guerra parecia uma possibilidade remota, a encíclica surpreendeu pelo tom duro e foi alvo de algumas críticas na imprensa secular e de alguns católicos laicos, que ainda defendiam a convivência pacífica com o Terceiro Reich e não compreenderam a atitude do Pontífice.[4]
Para escrever o documento, Pio XI contou com a colaboração e as informações dos cardeais alemães Adolf Bertram, Michael von Faulhaber e Karl Joseph Schulte e dos dois bispos mais contrários ao regime hitlerista: Clemens von Gallen e Konrad von Preysing, além da intervenção decisiva do Cardeal Eugênio Pacelli — futuro Papa Pio XII — e dos seus auxiliares alemães, Mons. Ludwig Kaas e dos jesuítas Robert Leiber e Augustin Bea.[4]