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imperador romano Da Wikipédia, a enciclopédia livre
Marco Aurélio Antonino Heliogábalo (em latim: Marcus Aurelius Antoninus Heliogabalus; c. 203 — 11 de março de 222), nascido como Sexto Vário Ávito Bassiano (em latim: Sextus Varius Avitus Bassianus), comumente conhecido como Heliogábalo ou Elagábalo, foi um imperador romano da dinastia severa dentre 218 a 222. Sua mãe Júlia Soémia era de origem síria e seu pai chamava-se Sexto Vário Marcelo. Como cidadão romano, seu nome provavelmente era Vário Avito Bassiano, mas ao tornar-se imperador, adotou o nome de Marco Aurélio Antonino. Apenas recebeu o cognome de Heliogábalo após a sua morte. Durante a sua juventude, serviu como sacerdote do deus Heliogábalo na cidade natal da família de sua mãe, Emesa, na província da Síria.
Heliogábalo | |
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Imperador romano | |
Reinado | 16 de maio de 218 a 11 de março de 222 |
Predecessores | Macrino e Diadumeniano |
Sucessor | Alexandre Severo |
Nascimento | c. 203 |
Morte | 11 de março de 222 (19 anos) Roma, Império Romano |
Nome completo | |
César Marco Aurélio Antonino Augusto | |
Nome de nascimento | Vário Avito Bassiano |
Esposas | Júlia Cornélia Paula Aquília Severa Ânia Faustina |
Descendência | Alexandre Severo (adotivo) |
Dinastia | Severa |
Pai | Sexto Vário Marcelo |
Mãe | Júlia Soêmia |
Em 217, o imperador Caracala foi assassinado e substituído pelo seu prefeito do pretório, Marco Opélio Macrino. A tia materna de Caracala, Júlia Mesa, instigou com sucesso uma revolta entre a Terceira Legião para ter o seu neto mais velho, Heliogábalo, declarado imperador. Macrino foi derrotado no dia 8 de junho de 218, na Batalha de Antioquia, depois da qual Heliogábalo, com apenas catorze anos de idade, ganhou o poder imperial e começou um reinado caracterizado principalmente por escândalos sexuais e controvérsias religiosas.
Diversos historiadores acreditam que posteriormente Heliogábalo mostrou desrespeito às tradições religiosas romanas e tabus sexuais. Heliogábalo substituiu o tradicional deus Júpiter no Panteão Romano pelo deus Heliogábalo, e forçou membros importantes do governo de Roma a participarem em rituais que celebravam esta divindade, liderados por ele próprio. Casou-se cinco vezes, levando favores dos bajuladores masculinos que se pensava popularmente terem intenções de serem seus amantes,[1][2] e diz-se que se prostituía no palácio imperial. Seu comportamento o distanciou da guarda pretoriana, do senado e dos cidadãos.
Entre crescente oposição, Heliogábalo, com apenas 18 anos, foi assassinado e substituído pelo seu primo Alexandre Severo no dia 11 de março de 222, numa conspiração feita pela sua avó, Júlia Mesa, e membros da guarda pretoriana.
Heliogábalo criou uma reputação entre os seus contemporâneos como excêntrico, decadente, e zelote, o que foi provavelmente exagerado pelos seus sucessores e rivais políticos.[3] Esta propaganda espalhou-se e, os historiadores no início da era moderna sujeitaram-no como um dos imperadores romanos com a pior reputação. Edward Gibbon, por exemplo, escreveu que Heliogábalo "abandonou a si mesmo para ter prazeres grosseiros e ser descontroladamente furioso".[4] De acordo com B.G. Niebuhr, "o nome Heliogábalo está gravado na História acima de todos os outros" por causa de sua "vida inefavelmente repugnante".[5] Os mais recentes historiadores têm tentado separar os fatos reais da ficção, preservando com maior cautela a visão deste personagem e seu reinado.[6]
Heliogábalo nasceu a cerca de 203[7] como Vário Avito Bassiano na família de Sexto Vário Marcelo e de Júlia Soémia Bassiana. O seu pai era inicialmente um membro da classe equestre, mas foi mais tarde elevado ao cargo de senador. A sua avó Júlia Mesa era a viúva do cônsul Júlio Avito, a irmã de Júlia Domna, e a cunhada do imperador Septímio Severo.[8] Júlia Soémia era uma prima do imperador Caracala. Outros parentes incluíam a sua tia Júlia Ávita Mameia e tio Marco Júlio Géssio Marciano e o filho deles, Alexandre Severo. A família de Heliogábalo tinha direitos hereditários ao sacerdócio do deus sol Heliogábalo, sendo Heliogábalo o alto sacerdote em Emesa (atual Homs) na Síria.[7]
A divindade Heliogábalo foi inicialmente venerado em Emesa.[9] O nome é latinizado da forma síria Ilāh hag-Gabal, El refere-se à divindade suprema semítica, enquanto que Gabal significa "montanha" (comparar com o hebraico גבל [gevul] e árabe جبل [jebel]), o que resulta em "Deus da Montanha" é a manifestação divina de Emesa.[10] O culto ao deus propagou-se a outras partes do Império Romano no século II, como por exemplo, uma consagração foi encontrada na distante Woerden, nos Países Baixos.[11] O deus foi mais tarde importado e assimilado com o deus romano do Sol, conhecido como Sol Indiges em tempos republicanos, e mais tarde Sol Invicto durante os séculos II e III.[12] Na Grécia, o nome do deus sol era Hélio, e consequentemente, adotou-se Heliogábalo.[13]
Quando o imperador Macrino chegou ao poder, suprimiu a ameaça vinda da família do seu antecessor assassinado, Caracala, ao exilá-los: Júlia Mesa, as duas filhas desta, bem como o neto mais velho, Heliogábalo, tiveram de ir para Emesa, na Síria. Quase imediatamente ao chegar na Síria, ela começou a conspirar, juntamente com o seu conselheiro eunuco e o tutor de Heliogábalo, Gânis, para derrubar Macrino e elevar o rapaz de catorze anos a imperador. Heliogábalo e a sua mãe colaboraram imediatamente e anunciaram, falsamente, que ele era o filho ilegítimo de Caracala, e por consequência deviam ter a lealdade dos soldados romanos e senadores que tinham jurado ser leais a Caracala.[7] Depois de Júlia Mesa ter demonstrado a sua riqueza à Terceira Legião em Rapana eles juraram lealdade a Heliogábalo. Ao nascer-do-sol no dia 16 de maio de 218, Públio Valério Comazão Eutiquiano, comandante da legião, declarou-o imperador.[14] Para reforçar a sua legitimidade através de mais propaganda, Heliogábalo assumiu os nomes de Caracala, Marco Aurélio Antonino.[15]
Em resposta, Macrino enviou o seu prefeito do pretório Úlpio Juliano para a região com um contingente de tropas que ele considerava forte o suficiente para esmagar a rebelião. Contudo, esta força juntou-se a Heliogábalo quando, durante a batalha, os soldados se viraram contra os seus próprios comandantes. Estes foram mortos e a cabeça de Juliano foi enviada ao imperador.[16]
Macrino enviou cartas ao senado denunciando Heliogábalo como o Falso Antonino e alegando que este era louco.[17] Conseguiu assim que os cônsules e outros membros importantes dos líderes de Roma o condenassem, e o senado declarou guerra contra Heliogábalo e Júlia Mesa.[18]
Macrino e o seu filho, enfraquecidos pela deserção da Segunda Legião devido a subornos e promessas circuladas por Júlia Mesa, foram derrotados a 8 de junho de 218 na Batalha de Antioquia pelas tropas de Gânis. Macrino fugiu para a Itália, disfarçado de mensageiro, mas foi mais tarde interceptado perto da Calcedónia e executado na Capadócia. O seu filho Diadumeniano, enviado para a corte parta para a sua própria segurança, foi capturado em Zeugma e assassinado também.[16]
Heliogábalo declarou a data da vitória em Antioquia como o início do seu reinado e assumiu os títulos imperiais sem esperar pela aprovação do senado,[19] o que violou a tradição, mas que era prática comum entre os imperadores do século III. Cartas de reconciliação foram enviadas para Roma estendendo anistia ao senado e reconhecendo as leis, ao mesmo tempo condenando a administração de Macrino e do seu filho.[20]
Os senadores responderam ao reconhecer Heliogábalo como imperador e aceitando a sua pretensão de ser filho de Caracala.[21] Caracala e Júlia Domna foram ambos deificados pelo senado, ambas Júlia Mesa e Júlia Soémia foram elevadas a augustas,[22] e a memória de Macrino e Diadumeniano foi condenada e vilificada pelo senado.[19] O ex-comandante da Terceira Legião, Comazão, foi nomeado comandante da guarda pretoriana.[23]
Heliogábalo e a sua corte passaram o inverno de 218 na Bitínia em Nicomédia,[21] onde, pela primeira vez, as crenças religiosas do imperador se manifestaram como sendo um problema. O historiador contemporâneo Dião Cássio sugere que Gânis foi de facto morto pelo novo imperador porque ele estava a forçar Heliogábalo a viver com "temperança e prudência".[24] Para ajudar os romanos a aceitarem à ideia de terem um sacerdote oriental como imperador, Júlia Mesa enviou a Roma uma pintura de Heliogábalo vestido de sacerdote, que foi pendurada acima da estátua da deusa Vitória na Casa do Senado.[21] Isto colocou os senadores na posição estranha de terem de dar oferendas a Heliogábalo sempre que davam oferendas a Vitória.
As legiões ficaram consternadas com este comportamento e arrependeram-se apressadamente da decisão de apoiarem Heliogábalo como imperador.[25] Enquanto Heliogábalo ainda estava a caminho de Roma, breves revoltas estalaram na Quarta Legião, instigadas por Gélio Máximo, e na Terceira Legião, que tinha sido responsável pela subida ao poder de Heliogábalo, a mando do senador Vero.[26] A rebelião foi rapidamente esmagada, e a Terceira Legião foi dissolvida.[27]
Quando a corte chegou a Roma no outono de 219, Comazão e outros aliados de Júlia Mesa e Heliogábalo foram dados posições poderosas e lucrativas, sendo considerado um ultraje para os muitos senadores que não os consideravam dignos.[28] Depois de ser prefeito do pretório, Comazão serviu como prefeito da cidade três vezes, e como cônsul duas vezes.[23] Heliogábalo brevemente desvalorizou a moeda romana, diminuindo a pureza da prata de 58% para 46,5% do denário — o peso real da prata caiu 1,82 gramas para 1,41 gramas. Ele também desvalorizou o antoniniano neste período em Roma.
Heliogábalo tentou fazer com que o seu suposto amante, o cocheiro de biga Hiérocles, fosse declarado "César",[29] enquanto outro suposto amante, o atleta Aurélio Zótico, recebeu o cargo não-administrativo mas influente de cubiculário.[30] A sua oferta de anistia aos líderes romanos foi grandemente honrada, embora o jurista Ulpiano tenha sido exilado.[31]
As relações entre Júlia Mesa, Júlia Soémia, e Heliogábalo eram boas no princípio. A sua mãe e avó foram as primeiras mulheres autorizadas a entrarem no senado,[32] e ambas receberam títulos senatoriais: Soémia teve o título tradicional de Clarissima e Mesa recebeu o menos ortodoxo Mater Castrorum et Senatus.[22] Enquanto Júlia Mesa tentou ser o poder atrás do trono e subsequentemente a mulher mais poderosa do mundo, Heliogábalo era altamente independente, com ideias próprias, e impossível de controlar.
Desde o reino de Septímio Severo, a veneração do sol tinha crescido no império.[33] Heliogábalo viu isto como uma oportunidade de tornar Heliogábalo como a divindade suprema no Panteão romano. O deus foi chamado Sol Invicto e foi posto acima de Júpiter.[34] Como sinal da união com a religião romana, Heliogábalo concedeu Astarte, Minerva, Urânia, ou uma combinação das três deusas, a Heliogábalo como esposa.[35]
Provocou mais ultraje ainda quando se casou com a virgem vestal Aquília Severa, proclamando que o casamento ia produzir "crianças parecidas com os deuses".[36] Esta era uma quebra flagrante da lei e tradição romana, que dizia que qualquer Vestal que tivesse tido relações sexuais devia ser enterrada viva.[37]
Um enorme templo chamado Elagabálio foi construído no leste do Palatino para albergar Heliogábalo, que era representado por um bétilo cónico negro de Emesa.[21] Herodiano escreveu que "esta pedra é venerada como se fosse enviada do céu; nela estão pequenas peças salientes e marcas que apontam para fora, que o povo gosta de acreditar ser uma imagem do sol, porque é assim que as vêem".[7] Com o objectivo de se tornar no sumo sacerdote da sua nova religião, Heliogábalo circuncidou-se.[34] Ele forçou senadores a assisti-lo dançar à volta do altar do deus Sol Invicto ao som de tambores e címbalos,[21] e em cada solstício de verão havia um ritual dedicado ao deus, o qual se tornou popular com as massas devido à grande distribuição de comida.[35] Durante este festival, Heliogábalo colocou a pedra de Emesa numa biga adornada em ouro e joias, que ele desfilou pela cidade:
Uma biga de seis cavalos levava a divindade, os cavalos enormes e de um branco puro, com arreios de ouro e ricos ornamentos. Ninguém segurava nas rédeas, e ninguém estava na carruagem; o veículo era escoltado como se o próprio deus fosse o cocheiro da biga. Heliogábalo corria de costas à frente da carruagem, olhando para o deus e segurando nas rédeas dos cavalos. Ele fez toda a viagem nesta maneira contrária, olhando para a face do seu deus.[35]
As relíquias mais sagradas da religião romana foram transferidas dos seus respectivos santuários para o Elagabálio, incluindo a Grande Mãe, o fogo de Vesta, os ancis dos sálios e o Paládio, de modo que nenhum outro deus excepto Heliogábalo fosse venerado.[38]
A orientação sexual e identidade de género de Heliogábalo são fonte de muito debate. Heliogábalo casou-se e divorciou-se de cinco mulheres,[36] três das quais são conhecidas. A sua primeira esposa foi Júlia Cornélia Paula, a segunda foi a virgem vestal Júlia Aquília Severa, mas num ano, ele abandonou-a e casou com Ânia Faustina,[35] uma descendente de Marco Aurélio e viúva de um homem recentemente executado por Heliogábalo. Ele voltou para sua segunda esposa Severa no fim do ano.[36] De acordo com Dião Cássio, a sua relação mais estável foi com o cocheiro de biga da sua quadriga, um escravo louro da Cária chamado Hiérocles, a quem Heliogábalo se referia como o seu marido.[29]
A História Augusta diz que ele também se casou com um homem chamado Aurélio Zótico, um atleta de Esmirna, numa cerimónia pública em Roma.[39] Dião Cássio diz que Heliogábalo pintava os olhos, depilava o seu cabelo e usava perucas antes de se prostituir em tavernas e bordéis,[40] e até no palácio imperial:
Ao final, ele reservava um quarto no palácio e lá cometia as suas indecências, sempre nu à porta do quarto, como fazem as prostitutas, e abanando a cortina pendurada em anéis de ouro, enquanto numa voz doce e comovente se oferecia aos que passavam. Havia, obviamente, homens que tinham sido especialmente instruídos para desempenhar o seu papel. Para, assim como em outras questões também económicas, ele tinha numerosos agentes que procuravam por aqueles que mais o agradavam para participar de suas vilezas. Ele poderia ter coletado o dinheiro de sua clientela e dado a si mesmo os seus ganhos; também poderia ter disputado com seus colegas essa indecente ocupação, argumentando que possuía mais amantes e mais dinheiro.[41]
Herodiano comentou que Heliogábalo mimava a sua beleza natural ao usar demasiada maquilhagem.[35] Foi descrito como "ficando encantado ao ser chamado a amante, a esposa, a rainha de Hiérocles" e diz-se que ofereceu grandes somas de dinheiro ao médico que lhe pudesse dar genitais femininos.[30] Subsequentemente, Heliogábalo tem sido frequentemente caracterizado por historiadores modernos como um transgénero, eventualmente transexual.[42][43] O Museu de North Hertfordshire, na Inglaterra, anunciou que o imperador, era uma mulher trans.[44][45]
Em 221, as excentricidades de Heliogábalo, particularmente a sua relação com Hiérocles,[29] enfurecia cada vez mais os soldados da guarda pretoriana. Quando sua avó Júlia Mesa se apercebeu que o apoio popular ao imperador estava a enfraquecer rapidamente, ela decidiu que ele e a sua mãe, os quais tinham encorajados as praticas religiosas dele, tinham de ser substituídos.[28]
Como alternativas, ela virou-se para a sua outra filha Júlia Ávita Mameia e o filho desta, Alexandre Severo, com treze anos. Convencendo Heliogábalo a nomear o seu primo como herdeiro, a Alexandre foi dado o título de César e partilhou o consulado com o imperador nesse ano.[28] Contudo, Heliogábalo reconsiderou isto quando começou a suspeitar que a guarda pretoriana favorecia o seu primo acima de si. Depois de falhados os vários atentados à vida de Alexandre, Heliogábalo despiu o seu primo dos seus títulos, revogou o seu título de cônsul e circulou a notícia de que Alexandre estava perto da morte para ver a reacção dos pretorianos. Um motim foi o resultado, e a guarda exigiu ver Heliogábalo e Alexandre no acampamento pretoriano.[46]
O imperador obedeceu e no dia 11 de março de 222, apresentou o seu primo, com a sua mãe Júlia Soémia. Ao chegarem ao campo pretoriano, os soldados aclamaram Alexandre, ignorando Heliogábalo, que ordenou a prisão e execução de todos os que tinham tomado parte neste desrespeito contra ele.[46] Em reposta, os pretorianos atacaram Heliogábalo e a sua mãe:
Ele tentou fugir, e teria escapado ao ser colocado numa arca, se não tivesse sido descoberto e assassinado, na idade de 18 anos. A sua mãe, que o abraçou e se agarrou a ele fortemente, pereceu com ele; as suas cabeças foram cortadas e os seus corpos, depois de serem despidos, foram primeiro arrastados pela cidade, e depois o corpo da mãe foi deixado num lugar qualquer, enquanto o dele foi atirado no rio.[47]
A seguir à sua morte, muitas pessoas associados a Heliogábalo foram mortos ou depostos, incluindo Hiérocles e Comazão.[47] Os seus edictos religiosos foram revocados e a pedra de Heliogábalo foi devolvido a Emesa.[48] Mulheres foram banidas de atenderem reuniões no senado,[32][49] e damnatio memoriae — o apagar uma pessoa de todos os registros públicos — foi decretada para ele.[50]
Uma campanha de propaganda contra Heliogábalo, tradicionalmente atribuída a Júlia Ávita Mameia, foi feita depois da morte dele. Muitas histórias degradantes e falsas sobre ele foram circuladas, e as suas excentricidades podem ter sido exageradas.[51] A mais famosa destas, imortalizada na pintura do século XIX As Rosas de Heliogábalo, conta que ele asfixiou convidados até à morte num jantar com um monte de "violetas e outras flores" que caíam de cima.[52]
A fonte de muitas destas histórias sobre a devassidão de Heliogábalo é a História Augusta, que, segundo a opinião geral erudita, não é confiável nos seus detalhes.[53] A Historia Augusta foi provavelmente escrita perto do fim do século IV durante o reinado do imperador Teodósio I,[54] e deve tanto à imaginação do seu autor como a fontes históricas. Crê-se que a vida de Heliogábalo como descrita na História Augusta é um trabalho de ficção histórica.[55] Apenas as secções 13 a 17, ligadas à queda de Heliogábalo, são consideradas com algum valor histórico.[56]
Fontes mais críveis do que a História Augusta incluem os historiadores contemporâneos de Heliogábalo, Dião Cássio e Herodiano. Dião Cássio viveu da segunda metade do século II até algum momento depois de 229. Nascido numa família patrícia, passou a maior parte da sua vida no serviço público. Foi senador sob o imperador Cómodo e governador de Esmirna depois da morte de Septímio Severo. Depois, serviu como cônsul por volta de 205, e como procônsul em África e na Panónia.
Alexandre Severo tinha-o em grande estima e o fez novamente cônsul. A sua História Romana cobre quase um milénio, desde a mítica chegada de Eneias à Itália até 229. Como contemporâneo de Heliogábalo, o relato de Dião Cássio sobre o reino do imperador é normalmente mais crível do que o da História Augusta, apesar de ser notado que Dião também passou a maior parte desse período fora de Roma e teve de confiar em relatos de segunda mão quando escreveu a sua História Romana.
Além disso, o clima político depois do reinado de Heliogábalo, assim como a posição de Dião dentro do governo de Alexandre, provavelmente impuseram restricções na fiabilidade da sua escrita neste período. Dião regularmente se refere à Heliogábalo como Sardanapalus, particularmente para distingui-lo do seu nome divino, mas sobretudo fazer com que sua parte seja mantida pelo damnatio memoriae imposto após a morte do imperador e associá-lo com outro autocrata notório por uma vida pervertida.[57]
Outro contemporâneo de Heliogábalo foi Herodiano, que era um servo civil romano que viveu de 170 até 240. O seu trabalho, "História do Império Romano desde Marco Aurélio", comumente abreviado para "História Romana", é um relato em primeira mão do reinado de Cómodo até ao princípio do reinado de Gordiano III. O seu trabalho, em grande medida, sobrepõe-se com a História Romana de Dião, mas ambos os textos parecem ser independentemente consistentes uns com a outra.[58]
Apesar de Herodiano não ser considerado tão fiável como Dião Cássio, a sua falta de pretensões literárias e eruditas fazem-no menos tendencioso do que os historiadores senatoriais. Herodiano é considerado a fonte mais importante sobre as fontes religiosas que aconteceram durante o reino de Heliogábalo, que foram confirmadas pela numismática[59][60] e arqueologia moderna.[61]
Para os leitores da era moderna, The History of the Decline and Fall of the Roman Empire de Edward Gibbon (1737-1794) foi mais a fundo nos comentários da reputação escandalosa de Heliogábalo. Gibbon não apenas aceitou e expressou ultraje às alegações dos antigos historiadores, mas apresentou mais alguns detalhes de si mesmo, sendo o primeiro historiador conhecido ao fato de que Gânis era um eunuco, por exemplo.[62] Gibbon escreve:
Para confundir a ordem da época e o clima, a diversão com paixões e os preconceitos do seu sujeito, e para subverter todos sob a lei da natureza e a decência, eram numerosas as sua mais deliciosas distrações. Uma longa quantia de concubinas, e uma rápida sucessão de vidas, dentre a qual estava uma virgem vestal, cativada pela força de seu santuário, foi insuficiente para satisfazer a impotência de suas paixões. O chefe do mundo romano afetado a copiar o estilo e vestimentas do sexo feminino, preferindo a mulher com o cetro, e desonrou as principais dignidades do império ao distribuí-los com seus numerosos amantes; um de quem foi publicamente investido com o título e a autoridade do imperador, ou, como ele particularmente o caracterizou, o marido da imperatriz. Isto pode parecer provável, os vícios e as folias de Heliogábalo tiveram de ser adornadas por fantasia, e a difamação o prejudicou. Ainda, confinam a nós mesmos as cenas públicas de espetáculo antes do povo romano, atestado por historiadores sepultados e contemporâneos, eles excedem inexpressívelmente a infâmia de algumas outras eras ou séculos.[4]
Duzentos anos após a era de Plínio, o uso do puro, ou de todas as misturas de sedas, foram confinadas ao sexo feminino, até que opulentos cidadãos de Roma e das províncias ficaram insensivelmente familiarizados com o exemplo de Heliogábalo, o primeiro que, por seus hábitos afeminados, tinha manchado a dignidade de um imperador e um homem.[63]
Os mais recentes historiadores tem repensado nas evidências de Heliogábalo e tem presenciado muitas imagens diferentes de sua vida e seu reino e as razões de sua morte. Martijn Icks em Images of Elagabalus (2008, republicado como The Crimes of Elagabalus em 2012 cita a irresponsabilidade dos antigos historiadores e conclui que este foi um imperador de políticas religiosas heterodoxas, mais propriamente do que seu comportamento sexual, de tal maneira que alienou o poder da elite de Roma. Sua avó percebeu ser propício seu fim e a substituição de Heliogábalo pelo primo.
Leonardo de Arrizabalaga y Prado, em The Emperor Elagabalus: Fact of Fiction? (2008), é igualmente a maior crítica aos antigos historiadores e especula que não foi a religiosidade nem a sexualidade responsáveis na queda do jovem imperador, que era simplesmente um fracassado em um esforço de poder dentro da família imperial; a lealdade da guarda pretoriana foi vendida, e Júlia Mesa tinha recursos para driblar seu neto. Uma vez que Heliogábalo, sua mãe, e seu imediato círculo haviam sido assassinados, uma grande guerra de propaganda contra sua memória resultou numa caricatura viciosa que tinha persistido até o presente, frequentemente adornada por historiadores posteriores mostrando seus próprios preconceitos da afeminação e outros vícios de Heliogábalo tinham vindos a compendiar.
Devido à antiga tradição sobre ele, Heliogábalo tornou-se algo de alguma importância ao decadentismo no final do século XIX.[43] Ele frequentemente aparece na literatura e em outras mídias como um epítome de um jovem, um esteta amoral. Sua vida e imagem inspirou ou ao menos instruiu muitas obras de arte notórias.[64]
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