Historicidade da Bíblia
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Historicidade da Bíblia diz respeito à forma como a Bíblia é encarada de um ponto de vista historiográfico. A História é uma disciplina que lida com o estudo de vestígios e documentos de épocas pretéritas tendo por vista pensar, interpretar e reconstruir o passado.[1] A Bíblia é um livro considerado sagrado por diversas denominações religiosas.[2] Por séculos foi vista como um documento derivado diretamente da inspiração divina, e por isso o que ela narrava era tido como verdade inquestionável, e mesmo suas narrativas puramente "históricas" eram consideradas relatos fidedignos do que acontecera no passado. Não importava, então, o contexto cultural, político e social em que havia sido escrita, uma vez que o estudo deste livro estava limitado ao debate teológico, moral e doutrinal, e tampouco haviam sido desenvolvidos métodos e ferramentas de pesquisa que pudessem dar subsídios sólidos para uma crítica objetiva sobre a factualidade dos eventos que narra.
Porém, ao longo do tempo alguns pensadores questionaram a veracidade de certas passagens. A crítica historiográfica baseada na abordagem científica ganhou força quando uma série de descobertas, entre elas o deciframento da escrita hieroglífica egípcia (1822), o deciframento da escrita cuneiforme acadiana (por volta de 1857) e escavações arqueológicas, começaram a trazer à luz muitas informações novas sobre o passado da região levantina, fazendo a Bíblia sair de seu isolamento teológico e ingressar no campo dos estudos acadêmicos seculares.[3] Desde então, muito do seu conteúdo histórico tem sido descartado como mito, lenda, alegoria ou construção política e teológica, seja por ser pouco plausível, seja por não ter sido possível comprovar sua factualidade com fontes e dados externos ao próprio texto. Além disso, há muitas contradições internas e larga porção está baseada em alegações de milagres e intervenções divinas. Hoje os livros da Bíblia são tratados como documentos iguais a quaisquer outros, devendo ser lidos criticamente e comparados com outras fontes (textuais, arqueológicas, epigráficas, etc), para distinguir-se o que têm de informação valiosa para elucidar alguns fatos e eventos e entender como a tradição religiosa e cultural da região se articulou e desenvolveu, e o que não é confiável, possuindo elementos fantasiosos, tendenciosos e de redação tardia em relação aos fatos narrados.[4][5]
Os especialistas que estudam a Bíblia hoje costumam ser divididos entre “minimalistas” e “maximalistas”. Os primeiros minimizam o uso do texto bíblico literal como fonte válida para a escrita da história de Israel, preferindo usar métodos de crítica textual, registros arqueológicos e comparação de fontes diferentes para a reconstrução da história antiga.[2] Nesse grupo estão estudiosos famosos como Keith Whitelam[6] e Thomas L. Thompson.[7] Os segundos, representados por Pierre Bordreuil e Françoise Briquel-Chatonnet,[8] entre outros, dão grande valor às informações do texto original e pretendem conservá-lo ao máximo.[2] É difícil, contudo, fazer divisões muito claras entre essas “escolas” de estudiosos: Philip Davies, por exemplo, entende que os textos bíblicos são necessários para se reconstruir uma história do pensamento israelita. William G. Dever, Israel Finkelstein e Amihai Mazar fornecem análises sobre os interesses ideológicos e o contexto social, cultural e político que influíram na redação.[9] Para Mario Liverani a história de Israel se divide entre uma história "normal", construída a partir de uma diversidade de fontes, entre elas as arqueológicas, e uma história "inventada", a forma como os redatores bíblicos reinterpretaram o passado.[10]