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Cotamas
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Cotamas (em berbere: Ikutamen; em árabe: كتامة; romaniz.: kutāma) eram uma tribo berbere no norte da Argélia, classificada dentro da confederação berbere dos bavares. São atestados muito antes, sob a forma cedamúsios (κοιδαμούσιοι) pelo geógrafo grego Ptolomeu. Desempenharam um papel fundamental no estabelecimento do Califado Fatímida (909–1171), formando a maior parte do exército fatímida que derrubou o Emirado Aglábida da Ifríquia, e que depois conquistou o Egito, o Sudão, o Hejaz e o sul do Levante entre 969–975. Os cotamas permaneceram como um dos pilares do exército fatímida até bem dentro do século XI.
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História antiga
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Os cotamas são atestados sob a forma cedamúsios (κοιδαμούσιοι) pelo geógrafo grego Ptolomeu, cuja documentação africana parece datar dos anos 100–110. Estavam então na região do rio Ampsaga (rio Rumel) na Mauritânia Cesariense. Ele os localiza a montante da tribo dos quituas (Khitouae) e a jusante da tribo dos toducas (Todoukae), elas próprias situadas perto das nascentes do rio.[1] No século II, faziam parte da confederação tribal dos bavares, que causou grandes dificuldades ao poder romano, tanto na Mauritânia Cesariense quanto depois na Sitifense após 303, e também na Numídia. Essa oposição política e militar não impediu certa romanização, ao menos pontual, como a criação do marco miliário República Vaartanênsio (respublica Vahartanensium), provavelmente ligada à necessidade de uma travessia viária do maciço, que mal é atestada até o reinado de Adriano (r. 117–138).[2]
Em 411, sua principal cidade, Ceramusa, está atestada como sede de um bispado. A mesma sé episcopal foi ocupada por um certo Montano de Cedamusa durante a era vândala. No século VI, durante o domínio bizantino, os cotamas estão atestados por uma inscrição cristã, na qual um “rei dos ucutumanos” (rex Ucutuma[niorum]) é dito ser o “servo de Deus” (Dei servus). Essa inscrição foi descoberta na passagem de Fdoulès, ao sul de Igilgilos, em uma das últimas passagens antes da descida para Milevo.[2] Segundo o arqueólogo Gabriel Camps, o fato de esse líder assumir o título de “rei” sugere que os cotamas estavam crescendo em importância e que seu líder começara a consolidar autoridade local.[3]
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História pós-clássica
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Perspectiva
Os cotama provavelmente haviam adotado o Islã, primeiro como carijitas, pouco antes de meados do século VIII. De fato, em 757–758, durante a tomada de Cairuão pelos ibaditas, havia cotamas entre as tropas carijitas aliadas a Abu Alcatabe Almaafiri e Abderramão ibne Rustão. Este último, então governador de Cairuão, nomeou um dos seus, Ucaiba, para chefiá-la.[4] Sabe-se pouco sobre os cotamas no restante do século VIII, após o advento do Emirado Aglábida de Cairuão em 789. Os cotamas se limitaram a ignorar as autoridades aglábidas e a acolher soldados rebeldes em suas montanhas inacessíveis. Sua grande população e o isolamento em suas montanhas fizeram com que não sofressem qualquer opressão por parte dessa dinastia.[4]
Conversão ao ismaelismo
No final do século IX, em Meca em 893/4, alguns notáveis cotamas encontraram o dai ismaelita Abu Abedalá Axii, que os atraiu ao xiismo ismaelita e os acompanhou no retorno. Em Icjane, sua principal cidade, o dai conseguiu conquistar a simpatia da população.[4] Provavelmente foi por essa época que começou sua expansão geográfica. O território que os cotamas passaram a ocupar a partir desse momento parece muito mais extenso do que fora em época romana; ele abrangia então as cadeias montanhosas do norte que se estendem de Bugia até os arredores de Constantina, região que Albacri chama de Jabal Cotama (Jabal Kotama), “as montanhas dos cotamas”. Essa área, limitada a oeste pelo país dos zuauas (Cabília do Jurjura, vale do Sumame e região de Bugia), estendia-se ao sul até Setife, Mila, Constantina, Collo e Jijel. Era formada pela Pequena Cabília, o maciço de Collo, parte da cadeia dos Bibanes, as montanhas de Ferjiua e a cadeia númida. Esta região possui um relevo extremamente acidentado, com costa abrupta, ladeada por montanhas arborizadas de acesso muito difícil, sendo as passagens extremamente raras, com montanhas que chegam a quase dois mil metros. As aldeias estão situadas em cumes e cristas de difícil acesso. A região se apresenta como uma fortaleza natural quase impenetrável.[5] Mais tarde, os cotamas se estabeleceram ainda mais ao sul, nas planícies. Essa expansão sugere que, aproveitando as fraquezas do governo central, os cotamas haviam reconstituído em seu próprio nome a antiga confederação dos Bavares e se estendido para o sul recuperando a orla dos planaltos altos que margeiam o flanco meridional de suas montanhas (regiões de Mila, Setife etc.), área favorável ao cultivo de cereais dos quais seus ancestrais tinham sido privados em época romana.[5]
Conquista do Emirado Aglábida

Abu Abedalá formou um exército poderoso e lançou suas tropas contra as fortalezas aglábidas na Pequena Cabília. Um primeiro ataque fracassou: após ocupar Mila em 902, o dai foi derrotado pelo filho do emir Ibraim II, que, no entanto, não conseguiu persegui-lo até Icjane. Os cotamas conseguiram se adaptar e constituir uma milícia formidável.[5] Sob as ordens de Abu Abedalá, tomaram Setife em 904, Belesma em 905, e depois Béja, enfrentando exércitos superiores em número e armamento. Em 907/8 atacaram o núcleo de Ifríquia. Após a capitulação de Mesquiana e Tébessa, capturaram Constantine. Abu Abedalá derrotou o exército de Ziadate Alá III em Alarbus (antiga Láribo); os aglábidas, derrotados em todos os lados e abandonados por seus partidários, fugiram para o Oriente. Os vencedores entraram em Cairuão, desfilando em Racada em março de 909.[6] O dai proclamou uma anistia, mas distribuiu os despojos entre suas forças. Seguro da vitória, revelou o nome de seu mestre, Abedalá Almadi Bilá, e partiu para Sijilmassa, onde ele estava detido, para escoltá-lo até Cairuão. No caminho, o exército cotama conquistou o imamato rustâmida e expulsou os ibaditas de Tiarete, que foram se refugiar em Sadrata, capital do oásis de Uargla.[7]
Ascensão ao destaque sob os primeiros fatímidas
Os cotamas foram o pilar e a elite dos primeiros exércitos fatímidas.[8] Embora outras tribos berberes logo tenham aderido ao estandarte fatímida — especialmente a grande confederação sanhaja durante o reinado de Almançor Bilá — os cotamas continuaram a constituir a maior parte dos exércitos fatímidas até depois da conquista fatímida do Egito em 969. Seu papel no Estado fatímida foi tão grande que ibne Caldune contou os fatímidas entre as dinastias berberes, e vários historiadores traçam a origem dos fatímidas aos berberes cotamas da Cabília, atribuindo-lhes o estabelecimento do Califado Fatímida após conquistarem Ifríquia e instalarem Abedalá Almadi Bilá como califa.[9][10] Segundo o historiador Heinz Halm, o primeiro Estado fatímida pode ser comparado a uma “hegemonia dos cotamas”, particularmente das quatro subtribos jimalas, laissas, malussas e ijanas.[11] Em 948, o califa al-Mansur observou publicamente que Deus lhes havia concedido preeminência sobre todos os outros povos, pois foram os primeiros a ver e aceitar a verdade.[12]
Por outro lado, esse domínio dos cotamas semicivilizados era profundamente ressentido, não apenas pelas outras tribos berberes, mas sobretudo pelos habitantes árabes e arabizados das cidades.[13] Como escreve Halm, a situação era semelhante a um cenário no qual, “no início do século XVIII na América do Norte, os iroqueses, convertidos ao catolicismo por missionários jesuítas, tivessem dominado as províncias puritanas da Nova Inglaterra, instalado seus chefes como governadores de Boston, Providence e Hartford, e proclamado um europeu com credenciais duvidosas como Rei da Inglaterra”.[13] Inevitavelmente, a arrogância e as exações dos cotamas levaram a rebeliões nos domínios fatímidas recém-conquistados, nas quais os cotamas foram particularmente visados e mortos pelos rebeldes.[14]
Declínio
Após a transferência da sede do califado para o Egito em 973, um grande número de cotamas acompanhou a dinastia para o leste. No entanto, as incursões no Levante na década de 970 revelaram as deficiências de um exército baseado exclusivamente nos cotamas e, a partir de 978, os fatímidas começaram a incorporar outros grupos étnicos, notadamente os turcos e os dailamitas, provenientes das terras islâmicas orientais, ao seu exército.[15] Em combinação com a dificuldade crescente de renovar seu contingente de recrutas cotamas após c. 987/88, esses eventos desafiaram a posição dos cotamas no exército. A partir de então, desenvolveu-se uma forte rivalidade entre os cotamas e os "Orientais" (Mashāriqa).[16]
Em 996, na ascensão de Aláqueme Bianre Alá, os cotamas recusaram-se a reconhecer o novo califa a menos que o líder cotama Alhaçane Abenamar fosse nomeado vizir. Isso foi feito, mas o regime flagrantemente pró-berbere de ibne Amar rapidamente alienou outros membros da elite, e ele foi deposto um ano depois.[17][18] Finalmente, quando Aláqueme assumiu as rédeas do governo em 1000, lançou uma purga das elites fatímidas, durante a qual ibne Amar e muitos outros cotamas proeminentes foram executados.[19]
A partir de então, a posição dos cotamas declinou de forma constante,[20] de modo que, em novembro de 1025, durante uma revista oficial, os outrora numerosos e orgulhosos cotamas encontravam-se reduzidos a pedir pão para saciar a fome.[21] Pouco depois, não foram capazes de mobilizar sequer 100 cavaleiros em curto prazo.[22] Por outro lado, o viajante persa Nácer Cosroes menciona que havia 20 mil cavaleiros cotamas durante sua visita ao Egito em 1047.[20] Durante o caos dos anos 1062–1073, os cotamas aliaram-se aos sudaneses contra os turcos e os dailamitas.[20] Os últimos remanescentes dos cotamas foram dispensados do exército fatímida depois que Badre Aljamali assumiu o poder em 1073.[20] Na Argélia, os cotamas originariam uma subdivisão: as tribos seduiqueches (Sedouikech) entre a região de Bugia e Constantina.[23]
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Referências
- Desanges 2008, p. 4269.
- Laporte 2005, pp. 4179-4181.
- Camps 1999, p. 55.
- Laporte 2005, p. 4181.
- Laporte 2005, p. 4182.
- Laporte 2005, p. 4183.
- Lewicki 1988, p. 298.
- Beshir 1978, p. 38.
- Beshir 1978, pp. 37–38.
- Daftary 2007, pp. 178–179.
- Beshir 1978, p. 39.
- Kitouni 2013, p. 58–60.
Bibliografia
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