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Republicanismo

defesa da república como forma de governo Da Wikipédia, a enciclopédia livre

Republicanismo
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O republicanismo é a ideologia segundo a qual uma nação é governada como uma república, na qual o chefe de Estado é escolhido através do voto ou do congresso (como em repúblicas parlamentares) para assumir a função por um determinado tempo, diferente da monarquia, na qual o indivíduo fica até o fim da vida ou sua abdicação.[1]

 Nota: "Republicanos" redireciona para este artigo. Para o partido político brasileiro, veja Republicanos (partido político).
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Alegoria da Proclamação da República publicada no jornal O Mequetrefe. Nela aparecem Deodoro da Fonseca, Ruy Barbosa, Quintino Bocaiuva, Silva Jardim, Lopes Trovão, José do Patrocínio e outros líderes do movimento republicano.

Entretando nas repúblicas o cargo de chefe de estado pode ser hereditário ou ter monarcas (hereditários ou não) como por exemplo; República de Genova, República de Florença, República das Duas Nações, República de Veneza, República Holandesa, Comunidade da Inglaterra, Escócia e Irlanda e Império Romano (de 27 ac a 284 de jure).

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Republicanismo na história

O termo "república" remonta à antiguidade greco-romana, e a moderna ideologia republicana tomou formas ligeiramente diferentes, dependendo se ela foi desenvolvida nos Estados Unidos, França ou Irlanda.[2]

Na versão ocidental, desenvolvida especialmente a partir dos escritos de Rousseau, defendeu o princípio da soberania popular e da participação popular. No entanto, no meio do século XX, inclui uma perspectiva individualista, isto é, assume-se que os indivíduos procuram a sua felicidade em si mesmo ao invés de uma participação política.[3]

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Republicanismo na Época Moderna

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Republicanismo, Humanismo Cívico e Maquiavel

O republicanismo moderno tem raízes profundas no humanismo cívico do Renascimento italiano. A partir do século XIV, eruditos como Francesco Petrarca promoveram a redescoberta de textos clássicos, especialmente de autores como Cícero, Quintiliano e Tito Lívio, nos quais encontraram modelos morais e políticos voltados para a vida pública. Essas ideias influenciaram diretamente o debate político nas cidades-Estado italianas, como Florença, Veneza e Gênova, onde o autogoverno e a participação cívica eram questões centrais.

O principal eixo dos debates renascentistas opunha autocracia e republicanismo, definidos respectivamente como o governo de um (monarca, príncipe ou senhor) e o governo de muitos (cidadãos ou magistrados). A decisão política, portanto, deveria ser concentrada ou compartilhada? Essa questão tornou-se central na teoria política da época. No interior desse contexto, Nicolau Maquiavel emergiu como um dos principais teóricos do republicanismo moderno. Em Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio, Maquiavel argumentou que as disputas e divergências políticas eram elementos positivos da vida republicana. Para ele, a liberdade não era fruto da harmonia artificial entre grupos, mas do conflito institucionalizado entre diferentes interesses, sobretudo entre “os grandes” e “o povo”. Uma república livre seria aquela capaz de construir instituições sólidas que canalizassem essas tensões, promovendo leis equilibradas e evitando abusos. Essa visão contrasta com o republicanismo clássico, que frequentemente tratava o conflito como sinal de degeneração política.

Ainda assim, tanto no republicanismo clássico quanto no renascentista, persistia a defesa do diálogo deliberativo como meio legítimo de solucionar disputas e preservar o bem comum. A figura do cidadão ativo e virtuoso permanecia no centro das discussões, reforçando a dimensão ética da participação política.[4]

Experiência Inglesa

A experiência inglesa dos séculos XVII e XVIII representou outro marco decisivo na formação do republicanismo moderno. O contexto das guerras civis (1642–1651), do regicídio de Carlos I (1649) e República de Cromwell alimentou intensos debates sobre o significado de liberdade, tirania e representação política. Influenciados pelas interpretações renascentistas de Maquiavel e pelos valores do humanismo cívico, pensadores como James Harrington, John Milton e, mais tarde, John Locke exploraram a ideia de que os indivíduos eram verdadeiramente livres apenas quando podiam agir segundo decisões tomadas por si mesmos – e não quando estavam submetidos à vontade arbitrária de um governante. Assim, a liberdade era concebida como não-dominação, conceito próximo ao defendido pelo republicanismo romano.[5]

A partir desse princípio, intensificou-se o sentimento antimonárquico, sobretudo após o regicídio, quando emergiu a questão: quem deve ser o detentor da liberdade, um governante único ou a comunidade dos cidadãos? A resposta republicana sustentava que somente uma república, baseada em leis estáveis, instituições representativas e magistraturas abertas aos cidadãos mais virtuosos, seria capaz de garantir direitos fundamentais, como vida, liberdade e propriedade. Essa tradição contribuiu para o surgimento de uma reflexão republicana que combinava participação cívica, limitação do poder e defesa do Estado de direito. Elementos desse pensamento influenciaram profundamente debates posteriores, incluindo a formulação das constituições inglesa (no longo processo pós-1688) e norte-americana (1787).[6]

Caso Norte-Americano

O desenvolvimento do republicanismo nos Estados Unidos ocorreu no contexto intelectual marcado pelos ideais burgueses e racionalistas que acompanharam a formação da primeira república moderna. Durante muito tempo, diversos intérpretes norte-americanos associaram a própria noção de modernidade ao liberalismo, entendendo que pensadores como Montesquieu e Kant só poderiam ser considerados modernos por serem liberais. A partir dessa leitura, tornou-se comum localizar as raízes da Revolução Americana quase exclusivamente no pensamento de John Locke, cujas formulações sobre governo limitado, propriedade e consentimento passaram a ser vistas como o núcleo filosófico da independência.[7]

Essa interpretação foi amplamente revisada por autores como J. G. A. Pocock, que em The Machiavellian Moment (1975) demonstrou que o republicanismo teve papel tão decisivo quanto o liberalismo na cultura política das colônias. Segundo Pocock, o imaginário dos founding fathers era fortemente moldado por tradições republicanas de longa duração – oriundas do Renascimento italiano, do humanismo cívico e da literatura política inglesa dos séculos XVII e XVIII. Nas décadas que antecederam a ruptura com a metrópole, líderes coloniais recorreram à história antiga e moderna em busca de exemplos de virtude, corrupção, liberdade e decadência, incorporando elementos centrais do republicanismo atlântico.

Nesse ambiente intelectual, o tema da separação dos poderes não surgiu inicialmente como prioridade. Ele ganhou centralidade apenas quando os revolucionários perceberam que o enfraquecimento das autoridades executivas tradicionais havia ampliado excessivamente o poder das assembleias legislativas. Como resposta a esse problema, os Estados Unidos articularam um modelo de separação de poderes formalizado e mecânico, inédito quando comparado às repúblicas precedentes. Esse arranjo combinava a dispersão de certas funções governamentais com a centralização de outras, preservando, contudo, o princípio de que a soberania permanecia indivisivelmente ancorada no povo.[8]

Outra característica distintiva do republicanismo norte-americano foi a clara diferenciação entre “política constitucional” e “política normal”. A primeira tratava dos fundamentos estruturais do regime e de seus limites institucionais; a segunda dizia respeito ao cotidiano da vida política, marcado pela deliberação e pela disputa entre interesses concorrentes. Essa distinção reforçou a ideia de que a solidez da república dependia, antes de tudo, de mecanismos institucionais estáveis, concebidos para prevenir a corrupção e assegurar o exercício legítimo da soberania popular.[9]

Ao contrário das tradições clássicas e renascentistas, o tema da virtude cívica ocupou posição secundária nos debates americanos. De modo geral, os revolucionários adotaram um republicanismo mais procedimental do que moral, preocupado menos com a formação ética do cidadão e mais com a criação de dispositivos institucionais capazes de evitar abusos de poder. Por isso, costuma-se caracterizar o republicanismo da Revolução Americana como mecânico, centrado na arquitetura jurídica e no equilíbrio entre funções do governo, e não na promoção de valores cívicos como honra ou virtude individual.

Republicanismo e a Revolução Francesa

A consolidação do republicanismo francês no final do século XVIII é frequentemente vista pelos estudiosos como um momento decisivo na história do pensamento político ocidental. Trata-se de uma etapa em que diversas correntes intelectuais, debates sociais e transformações institucionais convergiram para redefinir os fundamentos da vida pública. Como observa a historiografia recente, esse período não apenas aprofundou o vocabulário republicano europeu, mas também inaugurou novos modos de compreender a cidadania, a liberdade e o papel do Estado.

Segundo análises como a de Newton Bignotto[10], a experiência republicana na França levaria ainda décadas para adquirir estabilidade institucional, alcançando uma forma duradoura somente com a instalação da Terceira República na década de 1870. Contudo, os alicerces conceituais dessa tradição foram estabelecidos ao longo das décadas finais do Setecentos, quando novas concepções de indivíduo, história e política começaram a se consolidar. Nilo Odalia destaca que o século XVIII foi crucial para o surgimento da ideia do homem comum como sujeito de direitos civis, ao mesmo tempo em que emergia uma percepção inédita da própria posição humana na história. É nesse contexto que a noção de felicidade coletiva ganha forma, entendida não como satisfação individual, mas como objetivo a ser alcançado pela comunidade política.

A Revolução Francesa desempenhou papel central nesse processo ao derrubar a legitimidade da ordem hierárquica do Antigo Regime. A partir daí, caberia ao Estado garantir não apenas os direitos individuais, mas as condições que permitissem o exercício pleno da liberdade. Como argumenta Hannah Arendt, o desafio revolucionário ultrapassava a simples reivindicação de liberdades civis já vividas no âmbito privado: tratava-se de tornar visível e operante uma esfera pública, um espaço no qual a liberdade pudesse aparecer e se afirmar de modo institucionalizado. Para ela, a fundação de um corpo político capaz de sustentar esse espaço constituía o núcleo da experiência revolucionária.[6]

Outro elemento distintivo da tradição republicana francesa foi a ênfase na unidade e indivisibilidade da nação, característica sublinhada por autores como Bignotto. Essa concepção, profundamente marcada pelo contexto da Revolução, buscava garantir coesão política e impedir a fragmentação da soberania popular. Nesse sentido, temas como virtude cívica, interesse público e soberania popular tornaram-se centrais. A virtude, compreendida como prioridade do bem comum sobre os interesses particulares, era vista como condição indispensável para a preservação da liberdade e da própria república.

O pensamento de Jean-Jacques Rousseau teve impacto decisivo na formulação dessa matriz republicana. Suas reflexões sobre vontade geral, liberdade política e educação cívica inspiraram diversas correntes que atuaram tanto no debate revolucionário quanto na construção de instituições posteriores. A tradição francesa apropriou-se especialmente de suas concepções de virtude cívica, de sua valorização da liberdade como participação ativa na vida política e da ideia de que o interesse público deve orientar as ações do Estado e dos cidadãos.

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Neorrepublicanismo

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Desde fins dos anos 1980 e começos dos 1990 tem ressurgido uma corrente teórica republicana, ou neorrepublicana, especialmente nos países anglo-saxões. Os principais autores desse ressurgimento são, do ponto de vista da Teoria Política (ou da Filosofia Política), o irlandês Phillip Pettit, autor de Republicanism e, do ponto de vista da História, o inglês Quentin Skinner, autor de Liberty before Liberalism.

A teoria neorrepublicana de Pettit baseia-se na ideia de liberdade como "não-dominação" ou, de maneira mais direta, como "não-arbitrariedade". Para definir essa categoria, Pettit recupera as "duas liberdades" definidas por Isaiah Berlin (retomando uma ideia do francês Benjamin Constant), a liberdade negativa e a positiva.

A liberdade positiva consiste na participação direta dos cidadãos na vida política, com eles decidindo pessoal e constantemente os assuntos públicos; é o modelo característica e propriamente democrático, da Atenas idealizada por J.-J. Rousseau, em que todos participam do público e não há exatamente vida privada. Todos os cidadãos são livres porque submetem-se às leis que eles mesmos fizeram.[11][12]

A liberdade negativa consiste na ação desimpedida dos cidadãos em suas vidas particulares, em que o Estado é limitado e não oferece muitos empecilhos para os cidadãos. Como o que importa é a ausência de obstáculos à ação dos indivíduos - e há leis que devem impedir algumas ações, como as que proíbem matar -, toda lei é vista como cerceadora das liberdades. Os cidadãos participam da vida política por meio do processo representativo, ou seja, por meio da escolha de representantes (deputados). Esse é o ideal liberal, como exposto, por exemplo, por John Locke e os federalistas.[13][14][15]

A liberdade como não-arbitrariedade considera que as leis não são fundamentalmente obstáculos à ação individual, mas são constituidoras das liberdades: sem leis, ou seja, sem Estado não é possível a liberdade. Todavia, os cidadãos não participam da vida política (i. e., do Estado) o tempo inteiro, nem é o "povo" reunido em assembleia pública na ágora o autor das leis; a atuação dos cidadãos consiste em exercer um papel de fiscal e controlador do Estado, pelos mais variados meios, de modo a evitar e a impedir as arbitrariedades estatais. No modelo de Pettit, o processo legiferante continua nas mãos dos representantes eleitos, ou seja, dos deputados. O grande exemplo histórico é a Roma republicana, anterior ao Império e ao governo de Otávio Augusto; por esse motivo, essa teoria também é chamada de "neo-romana". Alguns grandes teóricos republicanos históricos são Cícero, Nicolau Maquiavel e Algernon Sidney.

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Ver também

Referências

  1. Mortimer N. S. Sellers. American Republicanism: Roman Ideology in the United States Constitution. New York, New York, USA: New York University Press, 1994. P. 71.
  2. (em inglês) Philip Pettit, The Tree of Liberty: Republicanism, American, French and Irish, Field Day Review, Vol. 1, pp. 29-41
  3. Jean-Fabien Spitz, Le Moment républicain.
  4. Scheiner, Lívia Mauricio; Simões, Rafael Cláudio (20 de julho de 2020). «Republicanismo: vitalidade de um conceito à luz das heranças da modernidade». Politeia - História e Sociedade (1). 73 páginas. ISSN 2236-8094. doi:10.22481/politeia.v19i1.6708. Consultado em 19 de novembro de 2025
  5. Barros, Alberto Ribeiro Gonçalves de (30 de dezembro de 2022). «Republicanismo inglês e a concepção neorromana de liberdade: a problemática interpretação de Quentin Skinner». Discurso (2): 122–140. ISSN 2318-8863. doi:10.11606/issn.2318-8863.discurso.2022.206607. Consultado em 19 de novembro de 2025
  6. Scheiner, Lívia Mauricio; Simões, Rafael Cláudio (20 de julho de 2020). «Republicanismo: vitalidade de um conceito à luz das heranças da modernidade». Politeia - História e Sociedade (1). 73 páginas. ISSN 2236-8094. doi:10.22481/politeia.v19i1.6708. Consultado em 19 de novembro de 2025
  7. Müller, Maria Cristina (3 de julho de 2013). «Revoluções americana e francesa: luta por liberdade ou libertação?». Cadernos de Ética e Filosofia Política (23): 64–77. ISSN 2317-806X. doi:10.11606/issn.1517-0128.v2i23p64-77. Consultado em 19 de novembro de 2025
  8. Scheiner, Lívia Mauricio; Simões, Rafael Cláudio (20 de julho de 2020). «Republicanismo: vitalidade de um conceito à luz das heranças da modernidade». Politeia - História e Sociedade (1). 73 páginas. ISSN 2236-8094. doi:10.22481/politeia.v19i1.6708. Consultado em 19 de novembro de 2025
  9. Elias, Maria Lígia Ganacim Granado Rodrigues (1 de agosto de 2007). «Republicanismo: história e atualidade». Em Tese (1): 43–64. ISSN 1806-5023. Consultado em 19 de novembro de 2025
  10. BIGNOTTO, Newton (2001). Origens do republicanismo moderno. Belo Horizonte: Editora da UFMG. p. 173
  11. Berlin, Isaiah. Four Essays on Liberty. 1969.
  12. Taylor, C. "What's Wrong with Negative Liberty" 1985. Law and Morality. 3rd ed. Ed. David Dyzenhaus, Sophia Reibetanz Moreau and Arthur Ripstein. Toronto: University of Toronto Press, 2008. 359-368.
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Bibliografia

Ligações externas

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