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Dona Ivone Lara

cantora e compositora brasileira (1922–2018) Da Wikipédia, a enciclopédia livre

Dona Ivone Lara
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Yvonne Lara da Costa OMC, mais conhecida como Dona Ivone Lara (Rio de Janeiro, 13 de abril de 1921[nota 1] – Rio de Janeiro, 16 de abril de 2018), foi uma cantora e compositora brasileira. Conhecida como Rainha do Samba e Grande Dama do Samba ela foi a primeira mulher a assinar um samba-enredo e a fazer parte da ala de compositores de uma escola, o Império Serrano.[2][3][4]

Factos rápidos Nome completo, Pseudônimo(s) ...

Formada em Enfermagem e Serviço Social, consagrou-se como cantora e compositora, desempenhando importante papel como enfermeira na reforma psiquiátrica no Brasil, ao lado da médica Nise da Silveira, dedicando-se a essa atividade durante mais de trinta anos, antes de se aposentar e dedicar-se exclusivamente à carreira artística.[5][6]

Em homenagem à Dona Ivone Lara, o dia 13 de abril foi instituído como Dia Nacional da Mulher Sambista.[7]

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Biografia

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Dona Ivone Lara nasceu em 13 de abril de 1921,[nota 1] na rua Voluntários da Pátria, em Botafogo, Zona Sul do Rio de Janeiro. Foi a primeira filha da união entre a costureira Emerentina Bento da Silva e João da Silva Lara.[1] Paralelamente ao trabalho, ambos tinham intensa vida musical: ele era violonista de sete cordas e desfilava no Bloco dos Africanos; ela era ótima cantora e emprestava sua voz de soprano a ranchos carnavalescos tradicionais do Rio de Janeiro, como o Flor do Abacate e o Ameno Resedá – nos quais seu João também se apresentava. Formada em enfermagem e serviço social, foi uma profissional na área de saúde durante mais de trinta anos até se aposentar em 1977.

Com a morte do pai, com menos de três anos de idade, e da mãe aos dezesseis,[1] foi criada pelos tios, e com eles aprendeu a tocar cavaquinho e a ouvir samba, ao lado do primo Mestre Fuleiro; teve aulas de canto com Lucília Guimarães e recebeu elogios do marido desta, o maestro Villa-Lobos.

Casou-se em 4 de dezembro de 1947 com Oscar Costa, filho de Alfredo Costa, presidente da escola de samba Prazer da Serrinha, com quem teve dois filhos, Alfredo e Odir. Foram casados durante 28 anos, até a morte de Oscar.[1] Foi no Prazer da Serrinha onde conheceu alguns compositores que viriam a ser seus parceiros em algumas composições, como Mano Décio da Viola e Silas de Oliveira. Em 2008 ela perde seu filho Odir, vítima de complicações decorrentes da diabetes.

Carreira como profissional de Saúde

Aos dezessete anos, Ivone entrou para a faculdade de enfermagem da atual Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), onde se graduou enfermeira. Aos 21 anos, prestou concurso público para o Ministério da Saúde e aos 25 foi contratada pelo Instituto de Psiquiatria do Engenho de Dentro. Lá, especializou-se em terapia ocupacional com a médica psiquiatra Nise da Silveira, área em que desempenhou um papel fundamental na reforma psiquiátrica no Brasil a partir da década de 1970. Durante mais de três décadas ela atuou na Colônia Juliano Moreira, com pacientes de doenças mentais.[6][4]

Ivone Lara se formou em Serviço Social, sendo uma das primeiras assistentes sociais do Brasil e uma das primeiras mulheres negras a se formarem em um curso superior no país. Seu trabalho nessa área foi tão importante que em 2016, a professora da Faculdade de Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Graziela Scheffer, publicou o artigo acadêmico "Serviço Social e Dona Ivone Lara: o lado negro e laico da nossa história profissional".[8]

Em uma época em que pacientes de doenças mentais eram institucionalizados e abandonados pela família, Ivone se deslocava para os municípios do Rio e de estados vizinhos, localizando parentes dos internos para apresentar uma visão diferente da maioria dos diagnósticos médicos, que desacreditavam da condição mental dessas pessoas. Tudo isso fazia parte de uma rotina terapêutica e de uma visão completamente nova que humanizava o tratamento da saúde mental. Além disso, Ivone trouxe a terapia musical para seus pacientes no Instituto de Psiquiatria do Engenho de Dentro. Usando seus contatos, conseguia patrocínio para os instrumentos e a criação de uma oficina de música,[9] que passou a apoiar festas e eventos de socialização entre os pacientes, seus familiares e os funcionários do hospital. Essa oficina mais tarde deu origem ao bloco de carnaval "Loucura Suburbana", que existe até hoje.[10][5] Em 1977, Ivone se aposentou da carreira em enfermagem e assistência social para se dedicar integralmente à sua carreira musical.[11][12]

Carreira como cantora e compositora

Ivone Lara compôs sua primeira música, Tiê, aos 12 anos, sobre um pássaro tiê-sangue que havia ganhado de seus primos, Hélio e Antônio dos Santos. Antônio, que era conhecido como Mestre Fuleiro, recebia os créditos pela maioria das primeiras composições de Ivone Lara, quando na época essa atribuição era tradicionalmente desempenhada por homens.[13]

Compôs o samba Nasci para Sofrer, que se tornou o hino da escola de samba Prazer da Serrinha, fundada na década de 40 e extinta em 1952. Com a fundação da escola de samba Império Serrano em 1947, passou a desfilar na ala das baianas. Em um ardil premeditado entre os dois, de inicio Fuleiro apresentou na ala dos compositores da Império Serrano os sambas compostos por Dona Ivone como se fossem de autoria dele, e somente alguns tempos depois, quando as canções tiveram ampla aceitação, foi que ele revelou como sendo de sua prima a autoria de tais composições. Ivone Lara foi anunciada como integrante da ala de compositores do Império Serrano somente em 1963, após 11 anos contribuindo com a escola. A historiadora Rachel Valença atribui que este reconhecimento demorou para ocorrer pois Ivone Lara não assinava suas próprias composições devido ao machismo que sofria entre os compositores de samba, frequentemente dando os créditos a Mestre Fuleiro.[14]

Em 1965, passou a assinar sambas enredo com seu próprio nome como principal autora, com Os Cinco Bailes da História do Rio.[11] Assim sendo, Dona Ivone teve a primazia de se tornar na primeira mulher a assinar um samba-enredo.[15]

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Dona Ivone desfilando pelo Império em 1990.

Em 1970, após se apresentar em programas como Amigo da Madrugada, apresentado por Adelzon Alves, Ivone Lara gravou seu primeiro disco, "Sambão '70", produzido por Alves e Osvaldo Sargentelli.[16]

Em 1975, seu filho Odir sofreu um acidente de carro, e por causa disso seu marido Oscar Costa teve um infarto fulminante e morreu. Apesar de seu marido nunca ter nada contra sua carreira, ele não gostava das rodas de samba.[carece de fontes?]

Em 1986, compôs um jingle para a campanha de Wellington Moreira Franco nas eleições para o governo do Rio de Janeiro naquele ano.[17] O sucesso da canção foi apontado como um dos fatores responsáveis pela vitória de Moreira Franco sobre o antropólogo Darcy Ribeiro.[18]

Dona Ivone também teve trabalhos como atriz, com participação em filmes, e foi a Tia Nastácia em especiais do programa Sítio do Pica-Pau Amarelo. Em 2008, interpretou a canção Mas Quem Disse Que Eu Te Esqueço no projeto Samba Social Clube. A faixa foi incluída, no ano seguinte, em uma coletânea com as melhores performances do projeto.

Entrevistas e apresentações de Dona Ivone Lara, Lúcio Alves, Monarco e a Velha Guarda da Portela, 1977. Arquivo Nacional.

Grafia do nome

Nascida Yvonne, adotou a grafia Ivone Lara para facilitar a popularização de seu nome como sambista.[11] Sargentelli e Alves adicionaram o prefixo "Dona" a seu nome artístico, contra a sua vontade.[13]

O álbum Samba minha verdade, samba minha raiz, de 1978, traz escrito "Dona Ivone Lara" em sua capa.[19] Todavia, Sorriso Negro, de 1981, traz na capa a escrita original de seu nome.[11] Diversos álbuns posteriores voltam a trazer a grafia "Ivone", como Nasci pra Sonhar e Cantar, de 2001,[20] e a coletânea SambaBook – Dona Ivone Lara, de 2015.[21]

Nas plataformas de streaming, seu nome está escrito Dona Ivone Lara.[22][23]

Morte

Dona Ivone morreu no dia 16 de abril de 2018 aos 97 anos,[nota 1] em consequência de um quadro de insuficiência cardiorrespiratória após permanecer internada por três dias no Centro de Tratamento e Terapia Intensiva (CTI) da Coordenação de Emergência Regional (CER), no Leblon, Rio de Janeiro.[2][3] O velório aconteceu na Quadra do Império Serrano, sua escola do coração, em Madureira, na Zona Norte da cidade. O enterro de Dona Ivone aconteceu no Cemitério de Inhaúma, no Rio de Janeiro.

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Legado e homenagens

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Perspectiva

Entre os intérpretes que gravaram suas composições destacam-se Clara Nunes, Roberto Ribeiro, Maria Bethânia, Gal Costa, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Paula Toller, Paulinho da Viola, Beth Carvalho, Mariene de Castro, Roberta Sá, Marisa Monte e Dorina. Uma de suas composições mais conhecidas, em parceria com Délcio Carvalho, foi Sonho Meu, sucesso na voz de Maria Bethânia e Gal Costa em 1978, cujo álbum ultrapassou um milhão de cópias vendidas.[1]

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Dona Ivone Lara é homenageada pelo Império Serrano em 2012.

Em 2012, foi homenageada pelo Império Serrano, no grupo de acesso, com o enredo Dona Ivone Lara: O enredo do meu samba. Em 2010 foi a homenageada na 21.ª edição do Prêmio da Música Brasileira. Em dezembro de 2014 foi a homenageada na 19.ª edição do Trem do Samba.[24] Um mês antes, Dona Ivone havia participado do primeiro dia de gravações do Sambabook, em homenagem à sua carreira da gravadora Musickeria. Cantores como Maria Bethânia, Elba Ramalho, Criolo, Zeca Pagodinho, Martinho da Vila, Arlindo Cruz, Adriana Calcanhoto, Zélia Duncan e Reinaldo, O Príncipe do Pagode fizeram versões de canções de Dona Ivone, enquanto ela própria gravou com Diogo Nogueira uma canção inédita, composta com seu neto, André.[25] Em 2015, entrou para a lista das "Dez Grandes Mulheres que Marcaram a História do Rio".[26]

Foi interpretada por Roberta Rodrigues em 2016, para o filme Nise: O Coração da Loucura.[27] Em 2025, foi anunciado que um filme baseado na vida de Dona Ivone Lara estava sendo preparado, com roteiro de Elísio Lopes Jr. e dirigido por Mayara Aguiar.[28]

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Discografia

  • 1970 - Sambão 70
  • 1972 - Quem samba fica?
  • 1974 - Samba minha verdade, minha raiz
  • 1979 - Sorriso de criança
  • 1980 - Serra dos meus sonhos dourados
  • 1981 - Sorriso negro
  • 1982 - Alegria minha gente
  • 1985 - Ivone Lara
  • 1986 - Arte do encontro (com Jovelina Pérola Negra)
  • 1998 - Bodas de ouro
  • 1999 - Um natal de samba (com Délcio Carvalho)
  • 2001 - Nasci para sonhar e cantar
  • 2004 - Sempre a cantar (com Toque de Prima)
  • 2009 - Canto de Rainha (DVD)
  • 2010 - Bodas de Coral (com Délcio de Carvalho)
  • 2010 - Nas escritas da vida (com Bruno Castro)
  • 2012 - Baú da Dona Ivone
  • 2015 - Sambabook Dona Ivone Lara (DVD)
  • 2015 - Sambabook Dona Ivone Lara (2 CDs)

Filmografia

Notas

  1. A data oficial de nascimento que consta nos documentos de Ivone Lara é 13 de abril de 1921, como no seu registro eleitoral no TSE. Algumas fontes, como UOL Música, mencionam que Ivone morreu logo depois de completar 97 anos, assim seu ano de nascimento seria 1921. Outras fontes, como Portal G1, afirmam que ela morreu aos 96 anos, sendo portanto de 1922. Na biografia Dona Ivone Lara: a Primeira Dama do Samba[1] (página 18), o jornalista Lucas Nobile escreve que a mãe de Ivone Lara "aumentou a idade da filha em um ano", declarando o ano de nascimento 1921, para a emissão do documento de identidade, permitindo assim que a filha fosse matriculada na tradicional Escola Municipal Orsina da Fonseca em 1932. Naquele ano, Ivone ainda não tinha a idade mínima de ingresso, que era de onze anos.
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    Referências

    1. Nobile, Lucas (2015). Dona Ivone Lara: A Primeira Dama do Samba. Col: Sambabook 1 ed. Rio de Janeiro: Sonora Editora. p. 230. ISBN 978-85-66567-16-8
    2. «Sambista Ivone Lara morre aos 97 anos no Rio de Janeiro». Portal UOL. 16 de Abril de 2018. Consultado em 17 de Abril de 2018
    3. «Morre no Rio cantora Dona Ivone Lara». Portal G1. 16 de Abril de 2018. Consultado em 17 de Abril de 2018
    4. Ferreira dos Santos, Joaquim (19 de abril de 2018). «Dona Ivone Lara Cantora do Sonho e da Liberdade». Revista Época. Consultado em 15 de julho de 2020
    5. «Morre D. Ivone Lara, enfermeira e ícone do samba brasileiro». Conselho Federal de Enfermagem COFEN. 17 de abril de 2018. Consultado em 15 de julho de 2020
    6. «Dona Ivone Lara: enfermeira, a Rainha do Samba participou da luta antimanicomial». História Ciências Saúde Manguinhos. Abril de 2018. Consultado em 15 de julho de 2020
    7. Scheffer, Graziela (1 de dezembro de 2016). «Serviço Social e Dona Ivone Lara: o lado negro e laico da nossa história profissional». CREES. Consultado em 15 de julho de 2020
    8. «Dona Ivone Lara: sambista, enfermeira e "feminista sem saber"». Revista Opera. 21 de abril de 2021. Consultado em 9 de outubro de 2025
    9. Teixeira, Pollyana (17 de abril de 2018). «Dona Ivone Lara dedicou maior parte de sua vida à saúde pública». Saúde MG. Consultado em 15 de julho de 2020
    10. «A militância por trás do 'Sorriso negro' de Dona Ivone Lara». O Globo. 13 de abril de 2021. Consultado em 9 de outubro de 2025
    11. Paiva, Vítor. «A nobreza e a elegância de uma rainha na vida e na obra de Dona Ivone Lara». Hypeness. Consultado em 15 de julho de 2020
    12. «O sorriso negro de Ivone Lara no Sesc Vila Mariana». Sesc São Paulo. 12 de abril de 2024. Consultado em 9 de outubro de 2025
    13. «Antes de virar 'dama do samba', Dona Ivone Lara teve que superar machismo do meio». CBN. 17 de abril de 2018. Consultado em 9 de outubro de 2025
    14. «Sorriso de criança aos 75 Anos». Suplemento "Tribina Bis", do jornal Tribuna da Imprensa, disponível na Hemeroteca da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro. 3 de março de 1997. p. 5. Consultado em 5 de junho de 2024
    15. Freixo, Adriano. «Segurança Pública no Rio de Janeiro: um pouco de história (não tão) antiga». Orbis Boletim do LEPEB-UFF. 2 (5). Consultado em 9 de outubro de 2025
    16. «Nasci pra Sonhar e Cantar». Discos do Brasil. Consultado em 16 de outubro de 2025
    17. «Sambabook Dona Ivone Lara». Rolling Stone Brasil. 16 de junho de 2015. Consultado em 16 de outubro de 2025
    18. «Dona Ivone Lara - Tema». YouTube. Consultado em 16 de outubro de 2025
    19. «Dona Ivone Lara». Spotify. Consultado em 16 de outubro de 2025
    20. Vinícius Volcof. «Nise – O Coração da Loucura (2015): amor como vocação». Cinema com Rapadura. Consultado em 9 de outubro de 2025
    21. «Vida de Dona Ivone Lara será contada em filme». O Globo. 6 de janeiro de 2025. Consultado em 16 de outubro de 2025
    22. «Doces recordações». Ocupação. Itaú Cultural. Consultado em 12 de setembro de 2025
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    Bibliografia

    Ligações externas

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