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Archaea

domínio da vida formado por organismos unicelulares Da Wikipédia, a enciclopédia livre

Archaea
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Archaea (singular: archaeon; do grego: ἀρχαῖος; archaĩos, antigo),[4][5] em português: arquea,[6][7][8] arqueiaAO 1990 ou arquaia,[8] é um domínio que agrupa microrganismos unicelulares procariontes (i.e. sem núcleo celular), morfologicamente semelhantes a bactérias, mas genética e bioquimicamente tão distintas destas como dos eucariontes. Estes organismos foram inicialmente classificadas como um tipo ancestral de bactérias, recebendo o nome Archaebacteria, classificação agora considerada obsoleta, tendo o grupo sido renomeado para esclarecer que os seus membros estão filogeneticamente mais próximos dos eucariontes do que das bactérias.[9] Porem, as moléculas de DNA das arqueias são organizadas em cromossomas circulares presentes no citoplasma, sem membrana envolvente, como equivalente nuclear.[10] As células dos Archaea apresentam propriedades únicas que as separam dos outros dois domínios, estando o grupo presentemente divididos em três reinos e com um número crescente de filos reconhecidos. Sua taxonomia ainda não é bem estabelecida pois a maioria das espécies conhecidas ainda não foi isolada em laboratório, tendo sido detectadas apenas pelas sequências genéticas presentes em amostras ambientais. Não se sabe se estes organismos são capazes de produzir endósporos. Não é conhecido neste agrupamento qualquer patógeno que afete humanos.

Factos rápidos Classificação científica, Reinos ...
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Halobacterium sp., estirpe NRC-1 (células com 5 μm de comprimento).
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Origem e evolução

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Perspectiva

A origem das arqueias parece ser muito antiga e as linhagens de Archaea podem ser as mais antigas que existem na Terra.[11] Embora se conheçam prováveis células procarióticas fósseis que datam de aproximadamente 3,5 bilhões de anos,[12] a maioria dos procariontes não tem morfologias distintas, e por isso as formas fósseis não podem ser usadas para identificá-los como arqueias.[13] Em vez disso, fósseis químicos de lípidos específicos são mais informativos porque tais compostos não ocorrem em outros organismos.[14] Os traços mais antigos destes lípidos (isoprenos) que se conhecem foram encontrados no cinturão de rochas verdes de Isua, na Gronelândia Ocidental, que inclui sedimentos formados há 3,8 bilhões de anos e que são os mais antigos que se conhecem.[15] Algumas publicações sugerem que restos lipídicos arqueais ou eucarióticos estão presentes em xistos que datam de 2,7 bilhões de anos atrás,[16] embora tais dados tenham sido questionados posteriormente.[17]

Carl Woese argumentou que as bactérias, as arqueias e os eucariontes representam diferentes linhas de descendência que divergiram de uma única colónia ancestral de organismos.[18][19] Uma possibilidade é que essa divergência tenha ocorrido antes da evolução das células, quando a falta de uma membrana celular permitia a transferência lateral de genes irrestrita, e que os ancestrais comuns dos três domínios surgiram pela fixação de subconjuntos específicos de genes.[19][20] Alguns biólogos, no entanto, argumentam que as arqueias e os eucariontes divergiram a partir de um grupo de bactérias.[21]

É possível que o último ancestral comum das bactérias e das arqueias fosse um microrganismo termófilo, o que levanta a possibilidade de que temperaturas menores são "ambientes extremos" para as arqueias, e que organismos de vivem em ambientes mais frios surgiram mais tarde na história da vida na Terra.[22]

Visto que os agrupamentos taxonômicos Archaea e Bacteria não são filogeneticamente mais próximos entre si do que são em relação aos eucariotas, isto levou a que o termo procariota não tivesse significado evolutivo e devesse ser descartada inteiramente.[23] No entanto, semelhanças estruturais e funcionais entre linhagens geralmente ocorrem por causa de traços ancestrais compartilhados ou convergência evolutiva. Essas semelhanças são conhecidas como grados, e os procariontes são melhor pensados como um grado evolutivo da vida, distinto por características como a ausência de organelos rodeados por membrana.[carece de fontes?]

A relação entre arqueias e os eucariontes permanece um problema importante. Para além das semelhanças na estrutura celular e função, muitas árvores genéticas juntam os dois grupos. Algumas análises anteriores sugeriam que a relação entre eucariontes e o filo Euryarchaeota são mais próximas que as relações entre os Euryarchaeota e o filo Crenarchaeota.[24] No entanto, é considerado mais provável que o ancestral dos eucariontes divergiu das arqueias em um momento evolutivo anterior.[25][26] A descoberta de genes parecidos com os de arqueias em certas bactérias como Thermotoga marítima, torna estas relações difíceis de determinar, uma vez que a transferência horizontal de genes ocorreu.[27] Alguns cientistas sugeriram que os eucariontes apareceram através de uma fusão de Archaea e Eubacteria, que se tornaram no núcleo e no citoplasma; isto conta para várias semelhanças genéticas mas torna-se difícil a explicar a estrutura celular.[28]

Relação com as bactérias

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Árvore filogenética mostrando as relações entre o agrupamento Archaea e as outras formas de vida celular. Os eucariontes estão a vermelho, as arqueias a verde e as bactérias a azul. Adaptado de Ciccarelli et al..[29]

As relações entre os três domínios da vida celular são de importância central para a compreensão da origem da vida. A maioria das vias metabólicas, que são o objeto da maioria dos genes de um organismo, são comuns entre Archaea e Bacteria, enquanto a maioria dos genes envolvidos na expressão de genes são comuns entre Archaea e Eukarya.[30]

Entre os procariotas, a estrutura celular das arqueias é mais semelhante à das bactérias gram-positivas, principalmente porque ambas têm uma única bicamada lipídica[31] e geralmente contêm um sáculo (sacculus) espesso, quase um exoesqueleto, de composição química variável.[32]

Em algumas árvores filogenéticas baseadas em diferentes sequências de genes e de proteínas de homólogos procarióticos, os genes e proteínas arqueais estão filogenomicamente mais intimamente relacionados com os homólogos de bactérias gram-positivas.[31] Arqueias e bactérias gram-positivas também compartilham inserções e deleções conservadas em várias proteínas importantes, como Hsp70 e glutamina sintetase I,[31][33] mas a filogenia desses genes foi interpretada para revelar a transferência de genes entre domínios,[34][35] e pode não refletir a relação entre linhagens.[36]

Foi proposto que as arqueias evoluíram a partir de bactérias gram-positivas em resposta a pressão seletiva causada por antibióticos naturais.[31][33][37] Essa teoria é sugerida pela observação de que as arqueias são resistentes a uma ampla variedade de antibióticos produzidos principalmente por bactérias gram-positivas,[31][33] e que esses antibióticos agem principalmente nos genes que distinguem arqueias das bactérias. A proposta assenta na constatação que a pressão seletiva para a resistência gerada pelos antibióticos gerados pelas bactérias gram-positivas foi suficiente para causar mudanças extensas em muitos dos genes-alvo dos antibióticos, e que essas estirpes representavam os ancestrais comuns das arqueias.[37]

A evolução das arqueias em resposta à seleção imposta pelos antibióticos, ou qualquer outra pressão seletiva competitiva, também poderia explicar a sua adaptação a ambientes extremos (como alta temperatura ou acidez) como resultado de uma busca por nichos desocupados para escapar aos organismos produtores de antibióticos.[37][38]

Cavalier-Smith propôs teorias explicativas das origem das arqueias similares.[39] Esta proposta também é apoiada por outro trabalho que investiga relações estruturais de proteínas[40] e estudos que sugerem que bactérias gram-positivas podem constituir as primeiras linhagens ramificadas dentro dos procariontes.[41]

Relação com os eucariontes

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Na teoria da simbiogénese, uma fusão de um Asgard arqueano e uma bactéria aeróbica criou os eucariontes, com mitocôndrias aeróbicas; uma segunda fusão adicionou cloroplastos, criando as plantas verdes.[42]

As relações evolutivas entre arqueias e eucariontes não são claras. Para além das semelhanças na estrutura e funções celulares, muitas árvores genéticas agrupam as duas linhagens.[43]

Entre os fatores que tornam complexa a relação evolutiva entre estes agrupamentos incluem-se alegações de que a proximidade filogenética entre os eucariontes e o filo arqueano Thermoproteota (ex-Crenarchaeota) é maior do que a existente entre os "Euryarchaeota" e o filo Thermoproteota,[44] e a presença de genes do tipo arqueano em certas bactérias, como Thermotoga maritima, devido à transferência horizontal de genes.[45]

A hipótese padrão postula que o antepassado dos eucariontes divergiu muito cedo das arqueias,[46][47] e que os eucariontes surgiram por simbiogénese em resultado da fusão de uma arqueia com uma eubactéria, que deram lugar ao aparecimento do núcleo celular e do citoplasma, respetivamente, o que explicaria várias parecenças genéticas entre os grupos.[42] Contudo, por outro lado, esta hipótese debate-se com múltiplas dificuldades para explicar a estrutura celular.[48]

Uma hipótese alternativa, a hipótese do eócito, postula que o domínio Eukaryota emergiu relativamente tarde do domínis Archaea,[49] o que explicaria as semelhanças entre os grupos. Nesse caso, ficaria estabelecido que Eukaryota se relaciona com Archaea pela proximidade de ambos com o clado TACK (siglas de quatro filos arqueanos).[50] Nesse contexto, a descoberta do clado TACK é fundamental para a compreensão da origem das arqueias e da primeira célula eucarionte. Nas diferentes árvores filogenéticas elaboradas, arqueias estariam realcionadas de diversas formas com eucariontes. Cruzando estes dados obtém-se um resultado que engrauece a hipótese dos três domínios, apoiando a hipótese do eócito e a simbiogénese pré-eucariota e depreender-se-ia a presença do superfilo que agrupa os vários filos arqueanos com Eukaryota sob as siglas TACK,[51] o que, segundo as árvores filogenéticas dos partidários desta hipótese, pode resumir-se da seguinte forma:

 Prokaryota 

 Bacteria 

 Archaea 
 

 Euryarchaeota, Nanoarchaeota

 TACK 

 Thaumarchaeota 

 Aigarchaeota 

 Crenarchaeota 

 Korarchaeota 

 + α─proteobacteria 

 Eukaryota 

Esta última hipótese foi fortalecida pela descoberta em 2015 de uma nova linhagem de arqueias, o género Lokiarchaeum (tipo do novo filo proposto "Lokiarchaeota"), nomeado a partir da designação de uma fonte hidrotermal chamada Castelo de Loki, situada no Oceano Ártico, que foi considerado o organismo arqueano filogeneticamente mais próximo dos eucariontes conhecido ao tempo. Tem sido considerado um organismo de transição entre procariontes e eucariontes.[52][53]

Vários filos irmãos de "Lokiarchaeota" já foram encontrados ("Thorarchaeota", "Odinarchaeota", "Heimdallarchaeota"), todos juntos compreendendo um supergrupo recentemente proposto Asgard, que pode ser considerado como um táxon irmão de Proteoarchaeota.[3][54][55]

Detalhes da relação dos membros do agrupamento Asgard e eucariontes ainda estão sob consideração,[56] embora, em janeiro de 2020, cientistas tenham relatado que Candidatus Prometheoarchaeum syntrophicum, um tipo de arqueia Asgard, pode ser uma possível ligação entre microrganismos procariontes simples e os organismos eucariontes complexos que existiram cerca de dois mil milhões anos atrás.[57][58]

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Descoberta e classificação

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Archaea foram detetados primeiramente em ambientes extremos, tais como em fontes termais vulcânicas (aqui a Grand Prismatic Spring do Yellowstone National Park.
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As arqueias prevalecem em ambientes hostis aos demais seres

O primeiro grupo de arqueias estudado foi o das espécies metanógenas. A metanogénese foi descoberta no lago Maggiore, na região alpina da Itália, em 1776, quando foi observado o borbulhar de "ar combustível" a partir de lamas situadas nas suas margens. Em 1882 observou-se que a produção de metano no intestino dos animais era devida à presença de microrganismos.[59]

Em 1936, ano que marcou o princípio da era moderna no estudo da metanogénese, o microbiologista norte-americano Horace Barker lançou as bases científicas para o estudo da fisiologia dos organismos produtores de metano e conseguiu desenvolver um meio de cultura apropriado para o crescimento dos organismos metanogênicos. Nesse ano foram identificados os géneros Methanococcus e Methanosarcina.[60]

As primeiras arqueias extremófilas foram encontradas em ambientes quentes. Em 1970, Thomas D. Brock, da Universidade de Wisconsin, descobriu o género Thermoplasma, um grupo de arqueias termoacidófilas, e em 1972 o género Sulfolobus, um grupo de arqueias hipertermófilas.[61] Brock ter-se-á iniciado em 1969 no campo da biologia dos hipertermófilos com a descoberta da espécie Thermus aquaticus, que é uma bactéria e não uma arqueia.

Em 1977 identificam-se as arqueias como o grupo procarionte filogeneticamente mais distante das bactérias ao ser demonstrado que os organismos metanogênicos daquele agrupamento apresentam uma profunda divergência com todas as bactérias estudadas. Nesse mesmo ano propôs a categoria de super-reino para este grupo com o nome de Archaebacteria. Em 1978, o Bergey's Manual of Systematic Bacteriology (o manual de Bergey) dá-lhe a categoria de filo, com o nome de Mendosicutes, e em 1984 divide o reino Procaryotae, ou Monera, em 4 divisões, agrupando as Archaebacteria na divisão Mendosicutes.[62]

As arqueias hipertermófilas foram incluídas em 1984 num agrupamento que recebeu o nome de Eocyta, identificando-as como um grupo independente das então chamadas arqueobactérias (em relação aos organismos metanogênicos) e às eubactérias, descobrindo-se para além disso que Eocyta era o grupo filogeneticamente mais próximo dos eucariontes.[63] A relação filogenética entre metanogênicos e hipertermófilos faz com que em 1990 se renomeie o agrupamento Eocyta como Crenarchaeota e os metanogênicos como Euryarchaeota, formando o novo grupo Archaea como um dos domínios do sistema dos três domínios.[64]

O novo domínio Archaea

Durante a maior parte do século XX, os procariontes foram vistos como um grupo singular de organismos e eram classificados com base na sua bioquímica, morfologia e metabolismo. Nesse período, os microbiologistas tentaram classificar os microrganismos com base nas estruturas das suas paredes celulares, nas suas formas e nas substâncias que consumiam.[65] No entanto, uma nova abordagem foi proposta em 1965 por Emile Zuckerkandl e Linus Pauling, usando as sequências genéticas destes organismos para estabelecer quais procariontes eram genuinamente relacionados uns com os outros.[66] Esta abordagem, conhecida como filogenética, é o principal método usado na classificação destes organismos.[67]

As arqueias foram primeiro classificados como um grupo de procariontes separados das bactérias em 1977, por Carl Woese e George E. Fox, apoiados em árvores filogenéticas baseadas em sequências de genes do ARN ribossomal (rRNA).[68][69] Os dois grupos assim encontrados foram designados por Archaebacteria e Eubacteria e tratados como reinos ou sub-reinos, que Woese e Fox denominaram Urkingdoms (ou Arquirreinos), argumentando que estes grupos de procariontes eram formas de vida fundamentalmente diferentes. Para enfatizar esta diferença, estes dois domínios foram mais tarde renomeados de Archaea e Bacteria. Para tal, Woese e Fox deram a como primeira evidência para suportar a existência do agrupamento Archaebacteria como uma "linha de descendência" separada os seguintes argumentos: (1) a falta de peptidoglicano nas suas paredes celulares; (2) a presença de duas coenzimas incomuns; e (3) resultados do sequenciamento do gene ARN ribossomal 16S apontando para uma origem genética distinta. Para enfatizar essa diferença, Woese, Otto Kandler e Mark Wheelis propuseram posteriormente a reclassificação dos organismos em três domínios naturais, numa estrutura que ficou conhecida como o "sistema dos três domínios": os domínios (1) Eukarya; (2) Bacteria; e (3) Archaea.[1] Ao propor a existência de três domínios assentes em linhagens há muito separadas, Carl Woese deu origem ao processo que ficou para a história da biologia como a revolução Woeseiana.[70]

O termo archaea tem origem no grego clássico ἀρχαῖα, palavra que significava 'coisas antigas' ou 'antiguidades',[71] pois como os primeiros representantes do domínio Archaea fossem organismos metanogênicos assumiu-se que o seu metabolismo refletia a atmosfera primitiva da Terra (mais concretamente a atmosfera pré-biótica) e seria reflexo da antiguidade destes organismos. Contudo, à medida que novos habitats foram estudados, mais organismos foram descobertos, questionando esse entendimento. No grupo foram também sucessivamente incluídos microrganismos halofílicos extremos[72] e micróbios hipertermofílicos.[73]

Em conclusão, inicialmente, e durante um período alargado, apenas os microrganismos metanogênicos foram colocados neste novo domínio, e as arqueias eram vistos como extremófilos que existiam apenas em habitats como fontes termais com temperaturas elevadas, lagos salgados e lagos hipersalinos. Nos finais do século XX, os microbiologistas perceberam que as arqueias, grupo então já consolidado como o domínio Archaea, eram um grande e diverso grupo de organismos que tinham uma vasta distribuição na natureza e eram comuns em habitats não extremos, estando presentes nos solos e oceanos.[74] Já se conhece também que as arqueias estão presentes no microbioma humano, apesar de não se conhecer nenhuma espécie de arqueia patogénica.[75]

Esta nova apreciação da importância e ubiquidade dos membros de Archaea resultou da expansão do uso das técnicas de reação em cadeia da polimerase para detectar procariontes em amostras de água ou solo, a partir apenas dos seus ácidos nucleicos. Isto permite a detecção e identificação de organismos que não podem ser cultivados no laboratório, processo muitas vezes difícil dados os requisitos específicos e interdependências que não são conhecidos.[76][77]

Comparação com os outros domínios

Para além das claras diferenças metabólicas e morfológicas em relação às bactérias, os membros do agrupamento Archaea possuem características ultraestruturais próprias que também suportam o seu distanciamento filogenético em relação aos eucariotas. A mais marcante dessas características distintivas é a ausência de um núcleo celular delimitado por uma membrana, motivo pelo qual tanto as arqueias como as bactérias são denominadas de procariontes. Uma vez que esta definição de procariontes é baseada numa característica que está presente nos eucariontes mas não está presente nos procariontes, alguns autores sugerem que a transcrição acoplada à tradução seja utilizada como característica apomórfica dos procariontes.[78]

Outra característica distintiva é a capacidade dos membros de Archaea usarem fontes de energia mais diversificadas do que eucariontes, variando de compostos orgânicos como os açúcares, até à amónia, a iões metálicos ou mesmo hidrogénio gasoso. O agrupamento Haloarchaea (ex-Halobacteria), que reúne organismos tolerantes ao sal, usam a luz solar como fonte de energia através de uma estrutura celular chamada bacteriorrodopsina, o que constitui um fenómeno de fototrofia (mas não de fotossíntese).[79] Também existem espécies de Archaea que são autotróficas, ou seja, que são capazes de fixar carbono atmosférico. Contudo, apesar de autotróficos, ao contrário das plantas e cianobactérias, nenhuma espécie conhecida de Archaea é capaz de usar energia solar para fixar carbono. Outro grupo de arqueias, pertencentes ao filo Euryarchaeota, conseguem produzir metano, sendo por isso chamadas de metanogénicas, na sua maior parte organismos que vivem no intestino de ruminantes.

Além disso, as arqueias possuem uma membrana celular com lipídios compostos de uma associação de glicerol-éter, enquanto que os das bactérias e eucariontes são compostos de glicerol-éster. As ligações éter são quimicamente mais estáveis do que as ligações éster, o que pode ser um fator que contribui para a capacidade de muitas Archaea sobreviverem em ambientes extremos que impõem forte ataque às membranas celulares, como o calor extremo e a hipersalinidade.

O grupo glicerol ao qual a cadeia hidrofóbica se encontra ligada tem estereoquímica diferente nas arqueias, comparativamente às bactérias e aos eucariotas. Também ao contrário das bactérias, as arqueias não possuem uma parede celular de peptidoglicanos. Apenas um grupo relativamente pequeno de arqueias possui uma parede celular composta por um polissacarídeo (pseudomureína), mas a maior parte das arqueias possui antes uma estrutura proteica para-cristalina chamada de S-layer (superfície S ou camada S).[80] Finalmente, o flagelo das arqueias é diferente em composição e desenvolvimento do das bactérias, tendo sido inclusivamente chamado de arcaelo (do neolatim archaellum) para evidenciar as diferenças relativamente ao flagelo bacteriano.[81]

Outra característica única de Archaea, não encontrada em nenhum outro grupo de organismos, é metanogénese (a produção metabólica de metano). As Archaea metanogénicas desempenham um papel fundamental em ecossistemas com organismos que obtêm energia da oxidação do metano, muitos dos quais são bactérias, pois costumam ser a principal fonte de metano nesses ambientes e podem desempenhar um importante papel como produtores primários. Os organismos metanogénicos também desempenham um papel crítico no ciclo do carbono, quebrando o carbono orgânico em metano, que também é um dos principais gases de efeito estufa.[82]

Essa diferença na estrutura bioquímica de Bacteria e Archaea foi explicada por meio de processos evolutivos. É teorizado que ambos os domínios tiveram origem em fontes hidrotermais alcalinas em mares profundos. Pelo menos duas vezes, os micróbios desenvolveram a biossíntese lipídica e a bioquímica da parede celular. Essas origens paralelas fundaram as linhagens separadas Archaea e Bacteria. Tem sido sugerido que o último ancestral comum universal não era um organismo de vida livre.[83] No entanto, esta visão foi contestada por outros investigadores e está atualmente em disputa.[84]

A análise comparativa de genomas de Archaea também identificou vários indels de assinatura conservados moleculares e a ocorrência de proteínas de assinatura exclusivamente presentes em todas as Archaeas ou em diferentes grupos principais dentro de Archaea.[85][86][87]

A tabela a seguir compara algumas das principais características dos três domínios, para ilustrar as semelhanças e diferenças que as arqueias compartilham com os outros domínios, incluindo as que lhes são exclusivas:[88]

Mais informação Propriedade, Bacteria ...

As principais diferenças e semelhanças podem-se resumir na seguinte tabela:[88]

Mais informação Compartilhadas com Bacteria, Compartilhadas com Eukarya ...

Questionamento do sistema de três domínios

Em hipóteses anteriores como a de Carl Woese, foi argumentado que as bactérias, arqueias e eucariontes representavam três linhagens evolutivas distintas que divergiram há muitos milhões de anos de um grupo ancestral de organismos.[97][98] Segundo Woese, como as arqueias e as bactérias não estariam mais estritamente relacionadas umas com as outras do que com os eucariontes, propôs-se que o termo "procarionte" não teria um verdadeiro sentido evolutivo e que por isso teria que ser desconsiderado por completo.[23]

Contudo, outros investigadores argumentam que arqueias e eucariontes surgiram de um grupo de bactérias.[99] Tendo essa possibilidade em vista, muitos biólogos evolutivos consideram que no sistema de três domínios se exagerou na diferença entre arqueias e bactérias, e sustentam que a transição mais dramática produziu-se entre Prokaryota e Eukaryota (sistema dos dois impérios), este último de origem mais recente por eucariogénese e como resultado da fusão endosimbiótica de pelo menos dois procariontes : uma arqueia e uma bactéria.

Assim, em alternativa à tese de Carl Woese, Cavalier-Smith propôs o clado Neomura para representar esta teoria; Neomura significa 'paredes novas' e faz referência à teoria de que as arqueias e os eucariontes teriam derivado de bactérias que (entre outras adaptações) substituíram as paredes de peptidoglicano por outras de glicoproteínas.

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Taxonomia

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Águas ácidas de uma mina coloridas pela presença de ARMAN (Archaeal Richmond Mine acidophilic nanoorganisms) um grupo de Archaea extremófilas descoberto no início do século XXI.

A classificação das arqueias e dos procariontes em geral é um campo contencioso e em rápida evolução. Os atuais sistemas de classificação, seguindo uma lógica assente em critérios filogenéticos, pretendem organizar as arqueias em grupos de organismos que partilham caracteres estruturais associados a ancestrais comuns.[100]

Estas classificações apoiam-se grandemente nas sequências de genes de ARN ribossomal para revelar as relações entre organismos (filogenética molelular).[101] A maioria das espécies de Archaea cultiváveis e bem investigadas são membros de dois filos principais, os Euryarchaeota e os Thermoproteota (anteriormente designados por Crenarchaeota). Outros grupos foram tentativamente criados, como, por exemplo, para a espécie peculiar Nanoarchaeum equitans, que foi descoberta em 2003, e para a qual foi proposto o seu próprio filo, o filo Nanoarchaeota.[102]

Um novo filo, o Korarchaeota, foi também proposto, contendo um pequeno grupo de espécies termofílicas pouco usuais, que partilham caracteres de ambos os filos principais, mas que aparenta ser filogeneticamente mais próxima dos Crenarchaeota.[103][104] Outras espécies detectadas recentemente aparentam ser apenas filogeneticamente relacionadas de maneira distante com algum destes grupos, tais como os Archaeal Richmond Mine Acidophilic Nanoorganisms (ARMAN, incluindo Micrarchaeota e Parvarchaeota), descobertos em 2006,[105] grupo que inclui alguns dos menores organismos conhecidos.[106]

Um superfilo, provisoriamente designado por TACK, que inclui Thaumarchaeota (agora Nitrososphaerota), "Aigarchaeota", Crenarchaeota (agora Thermoproteota) e "Korarchaeota" foi proposto em 2011 para permitir ligar as Archaea com a origem dos eucariontes.[107] Em 2017, o recém-descoberto e recém-nomeado superfilo Asgard foi proposto para agrupar os organismos filogeneticamente mais diretamente relacionados com o ancestral comum dos eucarióticos, formando um potencial grupo irmão do clado TACK.[54]

Em 2013, foi proposto o superfilo DPANN para agrupar "Nanoarchaeota", "Nanohaloarchaeota", Archaeal Richmond Mine acidophilic nanoorganisms (ARMAN, compreendendo "Micrarchaeota" e "Parvarchaeota"), e outras arqueias semelhantes. Este superfilo arqueano abrange pelo menos 10 linhagens diferentes e inclui organismos com células e tamanhos de genoma extremamente pequenos e capacidades metabólicas limitadas. Em consequência, muitos membros do DPANN podem ser obrigatoriamente dependentes de interações simbióticas com outros organismos e podem até incluir novas formas de parasitismo. Porém, em outras análises filogenéticas foi constatado que DPANN não forma um grupo monofilético e que é causado pela atração de ramo longo (LBA), sugerindo que todas essas linhagens pertencem a "Euryarchaeota".[2][108] Em 2015 foi sugerida a existência de um novo filo, o Lokiarchaeota.[109]

Os seguintes filos foram validamente publicados de acordo com o Código Bacteriológico:[110]

Os seguintes filos foram propostos, mas não foram validamente publicados de acordo com o Código Bacteriológico (incluindo aqueles que têm estatuto de candidatus):

  • "Candidatus Aenigmarchaeota"
  • "Candidatus Aigarchaeota"
  • "Candidatus Altiarchaeota"
  • "Candidatus Asgardaeota"
  • "Candidatus Bathyarchaeota"
  • "Candidatus Brockarchaeota"
  • "Candidatus Diapherotrites"
  • "Euryarchaeota"
  • "Candidatus Geoarchaeota"
  • "Candidatus Hadarchaeota"
  • "Candidatus Hadesarchaeota"
  • "Candidatus Halobacterota"
  • "Candidatus Heimdallarchaeota"
  • "Candidatus Helarchaeota"
  • "Candidatus Huberarchaeota"
  • "Candidatus Hydrothermarchaeota"
  • "Candidatus Korarchaeota"
  • "Candidatus Lokiarchaeia"
  • "Candidatus Lokiarchaeota"
  • "Candidatus Mamarchaeota"
  • "Candidatus Marsarchaeota"
  • "Candidatus Methanobacteriota"
  • "Candidatus Micrarchaeota"
  • "Candidatus Nanoarchaeota"
  • "Candidatus Nanohaloarchaeota"
  • "Candidatus Nezhaarchaeota"
  • "Candidatus Odinarchaeota"
  • "Candidatus Pacearchaeota"
  • "Candidatus Parvarchaeota"
  • "Candidatus Thermoplasmatota"
  • "Candidatus Thorarchaeota"
  • "Candidatus Undinarchaeota"
  • "Candidatus Verstraetearchaeota"
  • "Candidatus Woesearchaeota"

Cladograma

Embora a árvore filogenética de Archaea continue sem obter amplo consenso, os seguintes cladogramas apresentam as versões mais recentes:[111][112][113][114][115]

Mais informação Tom A. Williams et al. 2017 e Castelle & Banfield 2018 ...

O conceito de espécie em Archaea

A classificação das arqueias em espécies é também controversa, já que segundo a definição de Ernst Mayr, uma espécie é definida como um grupo de organismos geneticamente relacionados de tal forma que se podem reproduzir entre si e não com outros, ou seja que estão em isolamento reprodutivo. Esta definição pode ser aplicada com relativa facilidade a animais ou plantas, mas dificilmente se aplica às arqueias, que se reproduzem assexuadamente.[117]

Além disso, as arqueias apresentam um alto grau de transferência horizontal de genes entre linhagens distintas. Alguns pesquisadores sugerem que estas podem agrupar-se em populações similares a espécies, com células individuais que possuem grande similaridade entre seus genomas e que raramente transferem genes com grupos de células mais divergentes, como no caso do género Ferroplasma.[118] Por outro lado, em estudos realizados sobre o género Halorubrum encontrou-se uma significativa transferência de genes entre populações pouco relacionadas, o que limita a aplicabilidade deste critério.[119] Tais resultados levaram ao argumento de que classificar estes grupos de organismos em espécies tem pouco significado prático.[120]

Os conhecimentos disponíveis sobre a diversidade genética deste grupo são fragmentários e o número total de espécies de arqueias não pode ser estimado com precisão.[101][101] Mesmo estimativas do número total de filos variam entre 18 e 23, dos quais só 8 integram representantes que foram cultivados e estudados diretamente (na LPSN, a List of Prokaryotic names with Standing in Nomenclature, em 2023 figuram apenas 2 filos, e ainda assim sem aprovação formal).[121] Muitos destes grupos hipotéticos só são conhecidos por uma só sequência de ARNr, o que indica que a diversidade entre estes organismos continua pouco clara.[122] O problema de como estudar e classificar micróbios não cultivados, ocorre também em Bactéria.[123]

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Descrição

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Perspectiva

As arqueias partilham características que podem ser encontradas tanto entre os eucariontes como entre as bactérias. A título de exemplo, as arqueias possuem geralmente um único cromossoma circular, à semelhança das bactérias, mas os seus cromossomas podem ter mais do que uma origem de replicação, fenómeno que se pensava estar presente apenas nos eucariotas.[124]

Morfologia

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O tamanho de células procarióticas em relação a outras células e biomoléculas

Também no que respeita à morfologia, embora as arqueias e as bactérias sejam geralmente semelhantes em tamanho e forma, algumas espécies de arqueia apresentam morfologia muito diferente, como sejam as células planas e quadradas de Haloquadratum walsbyi.[125] Ainda assim, apesar das semelhanças morfológicas com as bactérias, as arqueias possuem genes e várias vias metabólicas que estão mais intimamente relacionadas com as dos eucariotas, nomeadamente no que concerne as enzimas envolvidas na transcrição e tradução genômica. Outros aspectos da bioquímica das arqueias são únicos, como a dependência de éteres lipídicos na estruturação das membranas celulares,[126] incluindo a presença de di-éteres do grupo arqueol (ou archaeol).

As células dos organismos do grupo Archaea têm um tamanho que varia de 0,1 micrómetros (μm) até 15 μm de diâmetro, e ocorrem numa variedade de formas, normalmente como esferas, bastonetes, espirais ou placas.[127] Outras morfologias nos Thermoproteota incluem células lobadas de forma irregular em Sulfolobus, filamentos em forma de agulha que têm menos que metade de um micrómetro de diâmetro em Thermofilum, e também bastonetes quase perfeitamente regulares em Thermoproteus e Pyrobaculum.[128] Existe mesmo uma espécie de Archaea com células de forma achatada e quase quadrangular chamada Haloquadra walsbyi que habita charcos hipersalinos.[129]

Estas formas pouco usuais são provavelmente mantidas quer pelas suas paredes celulares quer pelo citoesqueleto procariota. Proteínas relacionadas com os componentes do citoesqueleto de outros organismos ocorrem em arqueias,[130] e filamentos são formados dentro das suas células,[131] mas em contraste com outros organismos, estas estruturas celulares estão pouco estudadas nas arqueias.[132] Nos géneros Thermoplasma e Ferroplasma a falta de uma parede celular significa que as células têm formas irregulares e podem-se assemelhar a amebas.[133]

Algumas espécies de Archaea formam agregados ou filamentos de células com 200 μm de comprimento,[127] e estes organismos podem ser membros proeminentes da comunidade de micróbios que compõem os biofilmes.[134] Um exemplo extremo é a espécie Thermococcus coalescens, em que agregados de células se juntam formando células únicas gigantes.[135]

Uma particularmente elaborada forma de colónia multicelular é produzida por arqueias do género Pyrodictium, em que as células produzem conjuntos de longos e finos tubos ocos denominados cannulae que emergem da superfície das células e as interligam formando uma densa colónia aglomerada numa forma arbuscular.[136] A função destas cannulae é ainda desconhecida, mas poderão permitir que as células comuniquem ou troquem nutrientes com os seus vizinhos.[137]

As colónias podem também ser produzidas por associação ente diferentes espécies, incluindo organismos que não integram Archaea. Por exemplo, na comunidade de "cordão de pérolas" que foi descoberta em 2001 num pântano na Alemanha, colónias esbranquiçadas e arredondadas de uma nova espécie de Archaea do filo Euryarchaeota estão espaçadas ao longo de finos filamentos que podem ter até 15 cm de comprimento. Estes filamentos são formados de uma espécies particular de bactéria.[138]

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Estrutura celular

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Os membros de Archaea são semelhantes às bactérias na sua estrutura celular geral, mas a composição e organização de algumas dessas estruturas diferenciam as arqueias. Assim como as bactérias, as arqueias não possuem membranas internas, de modo que suas células não contêm organelos.[23] Estes organismos também se assemelham a bactérias em outros importantes aspectos: (1) a sua membrana celular é geralmente limitada por uma parede celular; e (2) nadam pelo uso de um ou mais flagelos.[139] Na estrutura geral, as arqueias são mais semelhante a bactérias gram-positivas, já que a maioria tem uma única membrana plasmática e parede celular e não apresentam espaço periplasmático. A exceção a esta regra geral é o género arqueano Ignicoccus, que possui um periplasma particularmente grande que contém vesículas ligadas à membrana e é envolvido por uma membrana externa.[140]

Parede celular e arcaelo

A maioria das arqueias (mas não os géneros Thermoplasma e Ferroplasma) possui uma parede celular.[133] Na maioria das arqueias, a parede é montada a partir de proteínas da camada superficial, que formam uma camada S (S-layer).[141]

A camada S é uma matriz rígida de moléculas de proteína que cobrem a parte externa da célula (como uma cota de malha numa armadura).[142] A presença dessa camada fornece proteção química e física e pode impedir que macromoléculas entrem em contato com a membrana celular.[143]

Ao contrário das bactérias, as arqueias não possuem peptidoglicano nas suas paredes celulares.[144] O grupo das Methanobacteriales apresenta paredes celulares contendo pseudopeptidoglicano, que se assemelha ao peptidoglicano eubacteriano em morfologia, função e estrutura física, mas é distinto na estrutura química. Neste composto faltam os D-aminoácidos e o ácido N-acetilmurâmico, estando o último substituído por ácido N-acetiltalosaminurónico.[143]

Os flagelos arqueanos são conhecidos como arcaelos (neolatim: archaellum, pl. archaella), que operam como os flagelos bacteriano, com longas caudas acionadas por motores rotatórios na base. Esses motores são alimentados por um gradiente de protões através da membrana. Contudo, embora morfologicamente similares, os arcaelos são notavelmente diferentes em composição e desenvolvimento em relação aos flagelos bacterianos.[139]

Os dois tipos de flagelos evoluíram de ancestrais diferentes. O flagelo bacteriano compartilha um ancestral comum com o sistema de secreção tipo III,[145][146] enquanto os flagelos de arqueias parecem ter evoluído de bactérias portadoras de pili do tipo IV.[147] Em contraste com o flagelo bacteriano, que é oco e montado por subunidades que se movem a partir de um poro central até a ponta do flagelo, os flagelos arqueanos são sintetizados pela adição de subunidades na base.[148]

Membrana celular

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Estrutura da membrana. Topo: um fosfolípidio arqueano, 1 cadeia lateral de isopreno, 2 ligação éter, 3 L-glicerol, 4 moléculas de fosfato. Meio: um fosfolípido similar aos presentes em células bacterianas e eucarióticas: 5 ácido gordo, 6 ligação éster, 7 D-glicerol, 8 fração benzílica de fosfato. Abaixo: 9 bicamada lipídica similar às presentes em bactérias e eucariotas, 10 monocamada lipídica presente em algumas arqueias.

As membranas das arqueias são constituídas por moléculas que são distintamente diferentes daquelas que estão presentes em todas as outras formas de vida, mostrando que as arqueias estão apenas distantemente relacionadas com as bactérias e os eucariotas.[149] Em todos os organismos, a membrana celular é constituída por moléculas conhecidas como fosfolípidos. Essas moléculas possuem uma parte polar que se dissolve em água (a "cabeça" de fosfato) e uma parte não polar, "gordurosa", que é hidrófuga (a cauda lipídica). Essas partes diferentes são conectadas por uma porção de glicerol. Na água, os fosfolipídios agrupam-se com as "cabeças" fosfatadas voltadas para a água e as caudas lipídicas voltadas para longe dela. A principal estrutura nas membranas celulares é uma dupla camada desses fosfolipídios, que é designada por bicamada lipídica.[150]

Os fosfolipídios de arqueias são incomuns de quatro maneiras:

  • Apresentam membranas compostas de glicerol-éter, enquanto as bactérias e os eucariontes têm membranas compostas principalmente de lípidos glicerol-éster.[151] A diferença é o tipo de ligação que une os lipídios à porção glicerol; os dois tipos são mostrados em amarelo na figura à direita. Em lípidos com éster, esta é uma ligação éster, enquanto em lípidos com éter é uma ligação éter.[152]
  • A estereoquímica da porção de glicerol arqueana é a imagem espelhada daquela encontrada em outros organismos. A porção de glicerol pode ocorrer em duas formas que são imagens espelhadas uma da outra, chamadas enantiómeros. Assim como uma mão direita não cabe facilmente numa luva para canhotos, os enantiómeros de um tipo geralmente não podem ser usados ou produzidos por enzimas adaptadas para o outro. Os fosfolipídios arqueais são construídos sobre uma espinha dorsal de sn-glicerol-1-fosfato, que é um enantiómero de sn-glicerol-3-fosfato, a espinha dorsal fosfolipídica encontrada em bactérias e eucariotas. Isso sugere que arqueias usam enzimas totalmente diferentes para sintetizar fosfolipídios em comparação com bactérias e eucariotas. Essas enzimas foram desenvolvidas muito cedo na história da vida, indicando uma divisão precoce em relação aos outros dois domínios.[149]
  • As caudas lipídicas arqueais diferem das de outros organismos por serem baseadas em longas cadeias isoprenoides com múltiplas ramificações laterais, às vezes com anéis de ciclopropano ou ciclohexano.[153] Em contraste, os ácidos gordos presentes nas membranas de outros organismos têm cadeias rectas sem ramificações laterais ou anéis. Embora os isoprenoides desempenhem um papel importante na bioquímica de muitos organismos, apenas as arqueias os utilizam para produzir fosfolípidos. Essas cadeias ramificadas podem ajudar a evitar que as membranas arqueais se esvaziem em altas temperaturas.[154]
  • Em algumas arqueias, a bicamada lipídica é substituída por uma monocamada. Com efeito, as arqueias fundem as caudas de duas moléculas de fosfolipídeos numa única molécula com duas cabeças polares (um bolaanfífilo ou bolaamphiphile); esta fusão pode tornar as membranas mais rígidas e mais capazes de resistir a ambientes agressivos.[155] Por exemplo, os lípidos presentes em Ferroplasma são deste tipo, o que ajudará a sobrevivência deste organismo no seu habitat altamente ácido.[156]
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Metabolismo

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Bacteriorodopsina de Halobacterium salinarum. O cofator retinol e os resíduos envolvidos na transferência de protões são mostrados como modelo de bolas e varetas.[157]

Arqueias exibem uma grande variedade de reações químicas em seu metabolismo e usa muitas fontes de energia. Essas reações são classificadas em grupos nutricionais, dependendo das fontes de energia e carbono. Algumas arqueias obtêm energia de compostos inorgânicos, como enxofre ou amónia (são organismos quimiotróficos). Entre estes incluem-se organismos nitrificadores, metanogénicos e oxidadores anaeróbicos do metano.[158]

Nessas reações, um composto cede eletrões a outro (numa reação redox), libertando energia para abastecer as atividades da célula. Um composto atua como um dador de eletrões e outro como um recetor de eletrões. A energia libertada é utilizada para gerar trifosfato de adenosina (ATP) por meio da quimiosmose, o mesmo processo básico que ocorre na mitocôndria das células eucarióticas.[159]

Outros grupos de arqueias usam a luz solar como fonte de energia (são fototróficos), mas a fotossíntese geradora de oxigénio não ocorre em nenhum desses organismos.[159] Muitas vias metabólicas básicas são compartilhadas entre todas as formas de vida; por exemplo, arqueias usam uma forma modificada de glicólise (a via Entner–Doudoroff) e um ciclo do ácido cítrico completo ou parcial.[160] Essas semelhanças com outros organismos provavelmente refletem tanto as primeiras origens na história da vida quanto o seu alto nível de eficiência.[161]

Mais informação Tipo nutricional, Fonte de energia ...

Alguns Euryarchaeota são metanogénicos (arqueias que produzem metano como resultado do seu metabolismo) vivendo em ambientes anaeróbicos, como pântanos. Essa forma de metabolismo evoluiu cedo e é até possível que o primeiro organismo de vida livre tenha sido um organismo metanogénico.[162] Na metanogénese, uma reação comum envolve o uso de dióxido de carbono como um recetor de eletrões para oxidar hidrogénio. A metanogénese envolve uma variedade de coenzimas que são exclusivas dessas arqueias, como a coenzima M e o metanofurano.[163]

Outros compostos orgânicos, como álcoois, ácido acético ou ácido fórmico, são usados como aceitadores de eletrões alternativos pelos metanogénicos. Essas reações são comuns em arqueias que têm como habitat o tracto gastrointestinal de mamíferos. O ácido acético também é decomposto em metano e dióxido de carbono diretamente, por arqueias acetotróficas. Esses acetotrofos são arqueias da ordem Methanosarcinales e constituem a maior parte das comunidades de microrganismos produtores de biogás.[164]

Outras arqueias usam CO2 da atmosfera como fonte de carbono, num processo chamado fixação de carbono (são organismos autotróficoss). Este processo envolve uma forma altamente modificada do ciclo de Calvin[165] ou, em alternativa, a via metabólica designada por ciclo 3-hidroxipropionato/4-hidroxibutirato.[166]

Os Thermoproteota também usam o ciclo reverso de Krebs, enquanto os "Euryarchaeota" também usam a via redutora do acetil-CoA (via Wood–Ljungdahl).[167] A fixação de carbono é alimentada por fontes de energia inorgânicas. Nenhuma arqueia conhecida realiza fotossíntese[168] (Halobacterium é o único arconte fototrófico conhecido, mas usa um processo alternativo à fotossíntese). As fontes de energia usada pelas arqueias são extremamente diversas, e vão desde a oxidação de amónia pelos Nitrosopumilales[169][170] à oxidação de sulfeto de hidrogénio ou enxofre elementar por espécies de Sulfolobus, usando oxigénio ou iões metálicos como recetores de eletrões.[159]

As arqueias fototróficas usam a luz para produzir energia química na forma de ATP. Nas Halobacteria, bombas iónicas ativadas por luz, como a bacteriorrodopsina e a halorrodopsina, geram gradientes iónicos bombeando iões para fora e para dentro da célula através da membrana plasmática. A energia armazenada nesse gradiente eletroquímico é então convertida em ATP pela ATP sintase.[127] Este processo é uma forma de fotofosforilação. A capacidade dessas bombas de luz para mover iões através das membranas depende de mudanças de luz na estrutura de um cofator retinol incrustado no centro da proteína.[171]

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Genética

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Sulfolobus infectado pelo DNA vírus STSV1[172] (barra com 1 micrómetro de comprimento).

As arqueias geralmente apresentam um único cromossomo circular,[173] que atinge 5 751 492 pares de bases em Methanosarcina acetivorans,[174] o maior genoma arqueano conhecido. O minúsculo genoma de apenas 490 885 pares de bases de Nanoarchaeum equitans tem um décimo desse tamanho e é o menor genoma arqueano conhecido, no quel se estima contenha apenas 537 genes que codificam proteínas.[175]

Pedaços independentes menores de DNA, designados por plasmídeos, também são encontrados em arqueias. Os plasmídeos podem ser transferidos entre células por contato físico, em num processo que pode ser semelhante à conjugação bacteriana.[176][177]

As arqueias são geneticamente distintos de bactérias e eucariontes, com até 15% das proteínas codificadas por genoma exclusivo do domínio, embora a maioria desses genes únicos não tenha função conhecida.[178]

A maioria da fração das proteínas únicas que têm uma função identificada pertence aos Euryarchaeota e está envolvida na metanogénese. As proteínas que as arqueias, as bactérias e os eucariontes compartilham formam um núcleo comum de função celular, relacionado principalmente coma transcrição, tradução e metabolismo dos nucleotídeos.[179] Outras características arqueanas diferenciadoras são a organização dos genes de função relacionada, tais como as enzimas que catalisam etapas na mesma via metabólica em novos operões e grandes diferenças em genes tRNA e suas aminoacil-tRNA sintetases.[179]

A transcrição em arqueias é mais semelhante à transcrição eucariótica do que à transcrição bacteriana, com a RNA polimerase arqueana a ser do ponto de vista molecular muito próxima da sua equivalente nos eucariotas,[173] enquanto a tradução em arqueias mostra sinais de equivalentes bacterianos e eucarióticos.[180]

Embora arqueias tenham apenas um tipo de RNA polimerase, a sua estrutura e função na transcrição parecem ser próximas às da RNA polimerase II eucariótica, com montagens de proteínas semelhantes (os factores de transcrição gerais) direcionando o ligação da RNA polimerase a um gene promotor,[181] mas outros fatores de transcrição arqueanos estão mais próximos daqueles que são encontrados em bactérias.[182]

A modificação pós-transcricional é mais simples do que nos eucariotas, uma vez que a maioria dos genes arqueanos não possui íntrons, embora existam muitos íntrons nos seus genes do RNA de transferência e RNA ribossomal,[183] e íntrons podem ocorrer em alguns genes que codificam proteínas.[184][185]

Transferência de genes e troca genética

A espécie Haloferax volcanii, uma arqueia halofílica extrema, forma pontes citoplasmáticas entre as células que parecem ser usadas para a transferência de DNA de uma célula para outra em ambas direções.[186]

Quando as arqueias hipertermofílicas Sulfolobus solfataricus[187] e Sulfolobus acidocaldarius[188] são expostas a irradiação UV prejudicial ao DNA ou aos agentes teratogénicos conhecidos por bleomicina ou mitomicina C, é induzida a agregação celular espécie-específica. A agregação em Sulfolobus solfataricus não pode ser induzida por outros factores físicos, como mudança de pH ou temperatura,[187] sugerindo que a agregação é induzida especificamente por danos no DNA.

Também foi demonstrado que que a agregação celular induzida por UV medeia a troca de marcadores cromossómicos com alta frequência em S. acidocaldarius.[188] As taxas de recombinação excederam as de culturas não induzidas em até três ordens de grandeza, o que indica que a agregação celular aumenta a transferência de DNA espécie-específica entre as células de Sulfolobus a fim de permitir o aumento da capacidade de reparação do DNA danificado por meio de recombinação homóloga.[187][188][189]

Essa resposta pode ser uma forma primitiva de interação sexual semelhante aos sistemas de transformação bacteriana mais bem estudados, que também estão associados à transferência de DNA espécie-específica entre células, levando ao reparo recombinatório homólogo de danos sofridos pelo DNA.[190]

Vírus que infectam Archaea

Arqueias são alvos de vários vírus que integram uma virosfera diversa distinta dos vírus bacterianos e eucarióticos. Os tipos conhecidos até agora foram organizados em 15-18 famílias baseadas em DNA, mas várias estirpes permanecem não isoladas e aguardam classificação.[191][192][193] Essas famílias podem ser informalmente divididas em dois grupos: vírus arqueia-específicos e cosmopolitas. Vírus específicos de Archaea têm como alvo apenas espécies arqueanas e atualmente incluem 12 famílias.

Numerosas estruturas virais únicas e não identificadas anteriormente foram observadas neste grupo, incluindo: vírus em forma de garrafa, em forma de fuso, em forma de espiral e em forma de gota.[192] Embora os ciclos reprodutivos e os mecanismos genômicas de espécies específicas de Archaea possam ser semelhantes a outros vírus, estes possuem características únicas que foram desenvolvidas especificamente devido à morfologia das células hospedeiras que infectam.[194] Os mecanismos de libertação destes vírus diferem dos de outros fagos. Os bacteriófagos geralmente passam por vias líticas, vias lisogénicas ou (raramente) uma mistura dos dois tipos de libertação do material genético na célula hospedeira.[195]

A maioria das estirpes virais específicas de Archaea mantém uma relação estável, um tanto lisogénica, com os seus hospedeiros, aparecendo como uma infecção crônica. Isso envolve a produção e libertação gradual e contínua de viriões sem matar a célula hospedeira.[196]

Foi levantada a hipótese de que os fagos das arqueias com cauda tiveram origem a partir de bacteriófagos capazes de infetar espécies de Haloarchaea.[197] Se a hipótese estiver correta, pode-se concluir que outros vírus de DNA de cadeia dupla que compõem o restante do grupo específico de arqueias são um grupo exclusivo na comunidade viral global. Por outro lado, os altos níveis de transferência horizontal de genes, as rápidas taxas de mutação nos genomas virais e a falta de sequências gênicas universais levaram os investigadores a perceber o caminho evolutivo dos vírus arqueais como uma rede.[192] A falta de semelhanças entre marcadores filogenéticos nesta rede e na virosfera global, bem como ligações externas a elementos não virais, pode sugerir que algumas estirpes de vírus específicos de Archaea evoluíram de elementos genéticos móveis (MGE) não virais.[192]

Esses vírus foram estudados com mais detalhes entre os grupos termofílicos, particularmente as ordens Sulfolobales e Thermoproteales.[197] Dois grupos de vírus de DNA de cadeia simples que infectam arqueias foram recentemente isolados. Um grupo é exemplificado pelo Halorubrum pleomórfico vírus 1 (Pleolipoviridae) infectando arqueias halofílicas,[198] e o outro por Aeropyrum coil-shaped virus (Spiraviridae) que infecta um hospedeiro hipertermofílico (crescimento ideal a 90–95 °C).[199] Notavelmente, o último destes vírus tem o maior genoma ssDNA atualmente conhecido. As defesas contra esses vírus podem envolver interferência de RNA a partir de sequências de DNA repetitivo relacionadas com os genes dos vírus.[200][201]

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Reprodução

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As arqueias seguem um processo de reprodução assexuada por fissão binária, fragmentação ou brotamento. Ao contrário das bactérias, nenhuma espécie conhecida de Archaea forma endósporos.

Os membros conhecidos de Archaea reproduzem-se assexuadamente por fissão binária ou múltipla), fragmentação ou brotamento. A mitose e a meiose não ocorrem, e por isso, se uma espécie de Archaea existe em mais de uma forma, todas têm o mesmo material genético.[202]

A divisão celular é controlada num ciclo celular, no qual após o cromossoma da célula ter sido replicado, os dois cromossomas-filhos separam-se e a célula é dividida.[203] No género Sulfolobus, o ciclo apresenta características semelhantes aos sistemas bacterianos e eucarióticos. Os cromossomas são replicados a partir de múltiplos pontos de partida (origens de replicação) usando DNA polimerases que se assemelham às enzimas eucarióticas equivalentes.[204]

Em Euryarchaeota, a proteína de divisão celular FtsZ, que forma um anel de contração ao redor da célula, e os componentes do septo que é construído no centro da célula, são semelhantes aos seus equivalentes bacterianos.[203] Nos agrupamentos Crenarchaea[205][206] e Thaumarchaea,[207] a maquinaria de divisão celular Cdv desempenha um papel semelhante. Esta maquinaria está relacionada com a maquinaria ESCRT-III eucariótica que, embora mais conhecida pelo seu papel na classificação celular, também foi encontrada desempenhando um papel na separação entre células divididas, sugerindo um papel ancestral na divisão celular.[208]

Tanto as bactérias quanto os eucariontes, mas não arqueias, produzem esporos.[209] Algumas espécies de Haloarchaea sofrem mudança fenotípica e crescem como vários tipos diferentes de células, incluindo estruturas de paredes espessas que são resistentes ao choque osmótico e permitem que aquelas arqueias sobrevivam em água com baixas concentrações de sal, mas não são estruturas reprodutivas, antes adaptações destinadas a alcançar novos habitats.[210]

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Ecologia

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As arqueias que crescem na água quente da fonte termal Morning Glory no Yellowstone National Park produz uma coloração brilhante naquelas águas.

As primeiras arqueias observadas foram extremófilos vivendo em ambientes extremos como fontes termais e lagos salgados, em ambientes sem outros organismos presentes. A melhoria das ferramentas de deteção molecular levou à descoberta de arqueias em quase todos os habitats, incluindo o solo,[211] os oceanos e as áreas pantanosas. Arqueias são particularmente numerosos nos oceanos, e as arqueias presentes no plâncton podem ser um dos grupos de organismos mais abundantes no planeta.

As arqueias são uma parte importante da vida na Terra, fazendo parte da microbiota de todos os organismos. No microbioma humano, estes organismos são importantes no intestino, na boca e na pele.[212]

A diversidade morfológica, metabólica e geográfica permite que as arqueias desempenhem múltiplos papéis ecológicos, entre os quais a fixação de carbono, o ciclo do azoto, a rotatividade de compostos orgânicos e a manutenção de comunidades microbianas simbióticas e sintróficas.[211][213]

Não se conhece qualquer exemplo claro de arqueia patogénicas ou parasitas, sendo, contudo, frequentemente mutualistas ou comensais, como é o caso das espécies matanogénicas (estirpes produtoras de metano) que habitam o trato gastrointestinal em humanos e ruminantes, onde o seu grande número facilita a digestão. As arqueias metanogénicas também são usados na produção de biogás e tratamento de esgotos. A biotecnologia explora enzimas de arqueias extremófilas que podem suportar altas temperaturas e a presença de solventes orgânicos tóxicos para a maioria dos microrganismos.

Comunicação

O fenómeno de detecção de quorum foi originalmente considerado como ausente em arqueias, mas estudos recentes mostraram evidências de que algumas espécies são capazes de realizar diafonia através da detecção de quorum. Outros estudos mostraram interações sintróficas entre arqueias e bactérias durante o crescimento de biofilmes.

Embora a pesquisa seja limitada na detecção de quorum entre arqueias, alguns estudos descobriram proteínas LuxR em espécies arqueanas, exibindo semelhanças com as bactérias LuxR e, finalmente, permitindo a detecção de pequenas moléculas que são usadas em comunicação da detecção de alta densidade populacional. Da mesma forma que as bactérias, os solos de Archaea LuxR demonstraram se ligar a AHLs (lactonas) e não-AHLs ligans, o que é uma grande parte na realização de comunicação intraespécies, interespécies e interreinos por meio da detecção de quorum.[214]

Habitats

Arqueias ocorrem numa ampla gama de habitats, sendo reconhecidos como uma parte importante dos ecossistemas globais,[74] e pode representar cerca de 20% das células microbianas nos oceanos.[215] No entanto, os primeiros arqueanos descobertos eram extremófilos.[158] De facto, algumas arqueias sobrevivem a altas temperaturas, muitas vezes acima de 100 °C, como encontrado em geysers, fumarolas negras (black smokers) e poços de petróleo. Outros habitats comuns incluem habitats muito frios e água altamente salinas, ácidas ou alcalinas, mas o grupo Archaea inclui mesófilos que crescem em condições amenas, em pântanos e alagadiços, esgotos, o oceano, o tracto intestinal dos animais e o solo.[211][74] Semelhante a rizobactérias promotoras do crescimento de plantas (PGPR), as arqueias são agora consideradas também como uma fonte de promoção do crescimento das plantas.[211]

Arqueias extremófilas são membros de quatro grupos fisiológicos principais. Estes são os halófilos, termófilos, alcalinófilos e acidófilos.[216] Esses grupos não são abrangentes ou específicos do filo, nem são mutuamente exclusivos, uma vez que algumas arqueias pertencem a vários grupos. No entanto, são um ponto de partida útil para a classificação.[217]

Os halófilos, incluindo o género Halobacterium, vivem em ambientes extremamente salinos, como os lagos hipersalinos, e superam em número os contrapartes bacterianos em salinidades superiores a 20–25%.[158]

Os termófilos crescem melhor em temperaturas acima de 45 °C, em locais como as fontes termais. As arqueias hipertermofílicos crescem melhor em temperaturas superiores a 80 °C.[218] A espécie Methanopyrus kandleri estirpe 116 reproduz-se em águas a 122 °C, a temperatura mais alta registada para qualquer organismo ativo.[219]

Outras arqueias existem em condições muito ácidas ou alcalinas.[216] Por exemplo, um dos acidófilos arqueanos mais extremos é Picrophilus torridus, que cresce a pH 0, o que equivale a prosperar em ácido sulfúrico a 1,2 molar.[220]

Essa resistência a ambientes extremos fez das arqueias o foco de especulação sobre as possíveis propriedades da vida extraterrestre.[221] Alguns habitats extremófilos não são muito diferentes daqueles que existem em Marte, levando à hipótese de que micróbios viáveis poderiam ser transferidos entre planetas em meteoritos.[222][223]

Recentemente, vários estudos mostraram que arqueias existem não apenas em ambientes mesófilos e termofílicos, mas também estão presentes, às vezes em grande número, em baixas temperaturas. Por exemplo, arqueias são comuns em ambientes oceânicos frios, como os mares polares.[224] Ainda mais significativo é o grande número de arqueias encontradas nos oceanos do mundo em habitats não extremos, especialmente entre a comunidade plânctonica (como parte do picoplâncton).[225]

Embora as arqueias possam estar presentes em números extremamente altos nos oceanos (até 40% da biomassa microbiana), quase nenhuma das espécies conhecidas foi isolada e estudada em cultura pura.[226] Consequentemente, a compreensão do papel das arqueias na ecologia oceânica é rudimentar, de modo que a sua influência total nos ciclos biogeoquímicos globais permanece amplamente inexplorada.[227]

Alguns Thermoproteota marinhos são capazes de nitrificação, sugerindo que esses organismos podem afetar o ciclo do azoto oceânico,[169] embora esses termoproteotas oceânicos também possam utilizar outras fontes de energia.[228]

Um grande número de arqueias também é encontrado nos sedimentos que cobrem o fundo do mar, com esses organismos constituindo a maioria das células vivas em profundidades superiores a 1 metro abaixo do fundo do oceano.[229][230]

Foi demonstrado que em todos os sedimentos da superfície oceânica (de 1 000 a 10 000 m de profundidade), o impacto da infecção viral é maior nas arqueias do que nas bactérias e a lise induzida por vírus das arqueias é responsável por até um terço da biomassa microbiana total morta, resultando na libertação de aproximadamente 0,3 a 0,5 gigatoneladas de carbono por ano globalmente.[231]

Papel nos ciclos biogeoquímicos

As arqueias reciclam elementos como o carbono, o azoto e o enxofre através da participação no respetivo ciclo biogeoquímico nos vários habitats em que estes organismos estão presentes.[232] As arqueias realizam muitas etapas no ciclo do azoto. Isso inclui tanto as reações que removem o azoto dos ecossistemas (como a respiração baseada em nitrato e a desnitrificação) quanto os processos que ali introduzem azoto (como a assimilação de nitrato e a fixação de azoto).[233][234]

Foi recentemente demonstrado o envolvimento de arqueias em reações de oxidação de amónia. Essas reações são particularmente importantes nos oceanos.[170][235] As arqueias também parecem cruciais para a oxidação de amónia nos solos, produzindo o nitrito que outros micróbios então oxidam para nitrato. Plantas e outros organismos consomem o nitrato assim produzido.[236]

No ciclo do enxofre, arqueias que crescem oxidando compostos de enxofre libertam esse elemento das rochas, tornando-o disponível para outros organismos, mas as arqueias que fazem isso, como Sulfolobus, produzem ácido sulfúrico como produto residual, e o crescimento desses organismos em minas abandonadas pode contribuir para a drenagem ácida de minas e outros danos ambientais.[237]

No ciclo do carbono, arqueias metanogénicos removem o hidrogénio e desempenham um papel importante na decomposição da matéria orgânica pelas populações de microorganismos que atuam como decompositores em ecossistemas anaeróbios, como sedimentos, pântanos e em sistemas de tratamento de esgoto.[238]

Interações com outros organismos

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Archaea metanogénicos formam uma simbiose com térmitas.

As interações bem caracterizadas entre arqueias e outros organismos são o mutulalismo ou o comensalismo. Não há exemplos claros de arqueias patógenicas ou parasitas conhecidas,[239][240] mas algumas espécies de organismos metanogénicos foram sugeridas como envolvidas em infecções na boca de humanos.[241][242]

A espécie Nanoarchaeum equitans pode ser um parasita de outra espécie de Archaea, já que só sobrevive e se reproduz dentro das células de Ignicoccus hospitalis (Crenarchaeota),[175] e parece não oferecer qualquer benefício ao seu hospedeiro.[243]

Mutualismo

Mutualismo é uma interação entre indivíduos de diferentes espécies que resulta em efeitos positivos (benéficos) na reprodução ou na sobrevivência das populações que interagem. Um exemplo bem compreendido de mutualismo é a interação entre protozoários e arqueias metanogénicas no tracto digestivo de animais que digerem celulose, como ruminante e térmitas.[244] Nesses ambientes anaeróbicos, os protozoários quebram a celulose vegetal para obter energia. Este processo liberta hidrogénio como produto residual, mas altos níveis de hidrogénio reduzem a produção de energia. Quando arqueias metanogénicas convertem hidrogénio em metano, os protozoários beneficiam de mais energia.[245]

Em protozoários anaeróbicos, como Plagiopyla frontata, as arqueias residem no interior dos protozoários e consomem o hidrogénio produzido nos seus hidrogenossomas.[246][247] Arqueias também se associam a organismos maiores. Por exemplo, a arqueia marinha Cenarchaeum symbiosum vive dentro (é um endossimbionte) da esponja Axinella mexicana.[248]

Comensalismo

Arqueias também podem ser comensais, beneficiando-se de uma associação sem ajudar ou prejudicar o outro organismo. Por exemplo, a arqueia metanogénica Methanobrevibacter smithii é de longe o arqueano mais comum na flora intestinal humana, constituindo cerca de um em cada dez de todos os procariotos no intestino humano.[249] Em térmitas e em humanos, esses organismos metanogénicos podem de facto ser mutualistas, interagindo com outros micróbios no intestino para ajudar na digestão.[250] Comunidades arqueanas também se associam a uma variedade de outros organismos, como na superfície de corais,[251] e na região do solo que envolve as raízes das plantas (a rizosfera).[252][253]

Parasitismo

Embora as arqueias não tenham uma reputação histórica de serem patógenos, são frequentemente encontrados com genomas semelhantes a patógenos mais comuns como Escherichia coli,[254] mostrando ligações metabólicas e história evolutiva com patógenos atuais. Arqueias também têm detecção inconsistente em estudos clínicos devido à falta de categorização em espécies mais específicas.[255]

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Usos em biotecnologia

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Perspectiva

As arqueias extremófilas, particularmente os resistentes ao calor ou a extremos de acidez e alcalinidade, são uma fonte de enzimas que funcionam sob essas condições adversas.[256][257] Essas enzimas encontraram muitos usos. Por exemplo, as DNA polimerases termoestáveis, como a Pfu DNA polimerase de Pyrococcus furiosus, revolucionou a biologia molecular ao permitir a reação em cadeia da polimerase para ser usado em pesquisa como uma técnica simples e rápida para clonagem de DNA. Na indústria, as amilases, galactosidases e pululanases encontradas em outras espécies de Pyrococcus que funcionam em temperaturas superiores a 100 °C permitem o processamento de alimentos em altas temperaturas, como a produção de leite com baixo teor de lactose e soro.[258]

As enzimas das arqueias termofílicas também tendem a ser muito estáveis em solventes orgânicos, permitindo o uso em processos ecologicamente sustentáveis de química verde para síntese de compostos orgânicos.[257] Essa estabilidade torna esses enzimas mais fáceis de usar em biologia estrutural. Consequentemente, as contrapartes de enzimas bacterianas ou eucarióticas de arqueias extremófilas são frequentemente usadas em estudos estruturais.[259]

Em contraste com a gama de aplicações das enzimas arqueanas, o uso dos próprios organismos em biotecnologia é menos desenvolvido. Arqueias metanogénicas são uma parte vital do tratamento de esgotos, pois fazem parte da comunidade de microrganismos que realizam a digestão anaeróbia e produzem biogás.[260] No processamento de minerais, arqueias acidófilas são promissoras para a extração de metais de minério, incluindo ouro, cobalto e cobre.[261]

Algumas arqueias produzem uma nova classe de antibióticos potencialmente úteis. Algumas dessas arqueocinas foram caracterizadas, mas acredita-se que existam centenas mais, especialmente nos géneros Haloarchaea e Sulfolobus. Esses compostos diferem em estrutura dos antibióticos bacterianos, portanto, podem ter novos modos de ação. Além disso, podem permitir a criação de novos marcadores selecionáveis para uso em biologia molecular arqueana.[262]

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Ver também

Referências

Bibliografia

Ligações externas

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